quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

 Supremo não reconheceu direito à entorpecência, diz Gilmar Mendes

·   Mateus Mello

18 de fevereiro de 2025, 11h13

·       Criminal

·       Judiciário

O ministro decano do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, disse nesta terça-feira (18/2) que a decisão da corte de descriminalizar o porte de maconha para consumo próprio não é o mesmo que legalizar o uso da droga.

“O Supremo não reconheceu um direito subjetivo à entorpecência, não impediu a apreensão de drogas pela polícia, não tornou o uso de drogas lícito. Ele segue antijurídico. Apenas trocou a esfera penal pela esfera da saúde pública”, afirmou o magistrado.

A declaração foi feita durante o seminário “A Política Nacional Sobre Drogas: Um Novo Paradigma”, promovido pela revista eletrônica Consultor Jurídico e pelo site Brasil 247 no Hotel Royal Tulip, em Brasília.

Gilmar justificou a postura do tribunal no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635.659 (Tema de Repercussão Geral 506). Ele disse que a tese firmada busca adequar o artigo 28 da Lei de Drogas ao objetivo da lei.

O dispositivo estabelece penas para quem “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização”. Mas, em seu parágrafo 2º, já determinava que os juízes deveriam observar o contexto da apreensão da droga, para determinar se o portador era traficante ou usuário.

Teoricamente, as penas previstas na norma não deveriam levar o usuário à prisão. Porém, a falta de critérios objetivos permitia que usuários fossem classificados como traficantes.

Além da falta de critérios, o decano apontou uma “segunda falha” da legislação: a criação de antecedentes criminais para usuários erroneamente enquadrados como traficantes. Para ele, isso reforçava a “estigmatização social do consumidor”.

Nesse contexto, Gilmar defendeu que a decisão do STF busca “humanizar o tratamento aos usuários e dependes da droga”.

O evento

Gilmar participou do painel “O significado da decisão do STF sobre porte da cannabis para uso pessoal”, ao lado da advogada e professora de Direito Penal Luciana Boiteux e do advogado e professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo Pierpaolo Bottini.

Também participaram a secretária Nacional de Política sobre Drogas do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Marta Machado; o advogado e doutor em Direito Penal pela USP Cristiano Maronna; e o juiz-auxiliar da presidência e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema Socioeducativo (DMF) do Conselho Nacional de Justiça, Luís Lanfredi.

O painel foi mediado pelo diretor da ConJur, Márcio Chaer; e pela editora especial do Brasil 247, Tereza Cruvinel.

A decisão do STF

Gilmar foi o relator do julgamento que, em junho 2024, descriminalizou o porte de maconha para consumo próprio. Em seu voto, apresentado em 2015, argumentou que “a criminalização da posse de drogas para uso pessoal conduz à ofensa, à privacidade e à intimidade do usuário” e desrespeita “a decisão da pessoa de colocar em risco a própria saúde”.

A corte estabeleceu a quantidade de 40 gramas, ou seis pés da planta, para diferenciar usuários de traficantes — um meio termo entre os 60 gramas propostos pelo ministro Alexandre de Moraes e os 25 gramas defendidos pelo ministro Cristiano Zanin.

A quantidade, contudo, não é um critério absoluto. Uma pessoa apreendida com menos de 40 gramas, por exemplo, pode ser enquadrada como traficante se houver provas de venda da droga.

Ao julgar o caso, o Supremo decidiu que a quantidade estabelecida vale até que o Congresso legisle sobre o assunto.

é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

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