Concessão de progressão de regime penal para Suzane von Richthofen
14 de
fevereiro de 2023, 20h51
Por Giovanna Zanata Barbosa e Rodrigo
Calbucci
O crime cometido por Suzane von
Richthofen e pelos irmãos Daniel e Cristian Cravinhos, há mais de 20
anos — em outubro de 2002 —, continua sendo pauta na imprensa.
Recentemente, muito se falou sobre a progressão do regime semiaberto para o
aberto, concedido a Suzane em janeiro de 2023, pela 2ª Vara de Execuções
Criminais de Taubaté (SP).
É de conhecimento público que ela foi condenada à pena de 39 anos e 6 meses de prisão, a ser cumprida, inicialmente, no regime fechado.
Desde 2002 — primeiro,
preventivamente, e, depois, em decorrência de sentença condenatória transitada
em julgado —, Suzane está presa. Somente em 2015, 13 anos após o
crime, foi concedida a progressão do regime fechado para o semiaberto, regime
no qual ela permaneceu até o início do ano de 2023.
Tanto a progressão do regime fechado
para o semiaberto, quanto do semiaberto para o aberto, ocorreu em virtude do
cumprimento do lapso temporal previsto pela legislação processual penal e pelo
chamado bom comportamento carcerário.
Essa possibilidade de progressão de
regime, baseada no comportamento e no lapso temporal, é um reflexo da aplicação
do princípio da individualização da pena na execução penal. Nas palavras
de Thiago Cabral:
"O
comportamento do sentenciado, destarte, é o reflexo de sua personalidade e,
assim, da sua individualidade, o qual serve de parâmetro à individualização da
sanção penal no curso de seu cumprimento" [1],
E, apesar de juridicamente correta, a
decisão prolatada pela 2ª Vara de Execuções Criminais de Taubaté causou espanto
em uma parcela da sociedade.
Isso pode ser explicado, em parte,
pelo desconhecimento da Lei de Execução Penal (Lei Federal n° 8.072/1990), que
estabelece que a execução penal deve ser regida pelo princípio da
progressividade no cumprimento da pena. Sempre que possível, haverá a
progressão do regime mais para o menos gravoso.
Ademais, sobre o sistema progressivo,
a exposição de motivos da Lei de Execução Penal argumenta que "[...]
o processo de execução deve ser dinâmico, sujeito a mutações". "As
mudanças no itinerário da execução consistem na transferência do condenado de
regime mais rigoroso para outro menos rigoroso (progressão) ou de regime menos
rigoroso para outro mais rigoroso (regressão)."
Ainda sobre a progressão e
individualização da pena, Guilherme Nucci pontua que:
"Todos esses
benefícios [progressão de regime, indulto, liberdade
condicional etc.] constituem a individualização executória da pena, que
depende do comportamento individual de cada sentenciado. Merecendo, progride;
desmerecendo, permanece em regime mais severo [2]."
Destaque-se ainda que o sistema
progressivo é essencial para a reinserção do apenado em sociedade. Nesse
sentido, é a lição de Salo de Carvalho:
"O sistema
progressivo, baseado na ideia de mérito do condenado, foi eleito em 1984, como
instrumento hábil para atingir a finalidade de reinserção social. Típico dos
modelos estatais intervencionistas, o escopo ressocializador legitimou a ação
dos aparelhos punitivos para avaliação e formatação da identidade do preso.
Assim, o condenado ressocializado, no discurso da LEP, era aquele adequado às
regras do estabelecimento carcerário e ao programa individualizador, ou seja, o
sujeito disciplinado e ordeiro que se submetia e respondia satisfatoriamente ao
tratamento penal" [3].
De fato, a própria exposição de
motivos da Lei de Execução Penal (Lei Federal n° 8.072/1990) preceitua que a
referida legislação se baseou na ideia de que a pena tem a finalidade da
reinserção social:
"14. Sem
questionar profundamente a grande temática das finalidades da pena, curva-se o
Projeto, na esteira das concepções menos sujeitas à polêmica doutrinária, ao
princípio de que as penas e medidas de segurança devem realizar a proteção dos
bens jurídicos e a reincorporação do autor à comunidade".
Desse modo, embora se compreenda o
desejo de uma parcela da sociedade brasileira para que Suzane permanecesse mais
tempo no cárcere, é fundamental ter em mente que a nossa legislação estabelece
regras e limites relacionados ao cumprimento da pena, de modo que a decisão
prolatada em janeiro de 2023, pela 2ª Vara de Execuções Criminais de
Taubaté — que concedeu a possibilidade dela cumprir o restante de sua
pena no regime aberto — é absolutamente legal e pautada pelos ditames
da Lei de Execução Penal, seguindo, basicamente, os princípios da
individualização da pena e da progressividade.
[1] CABRAL,
Thiago Colnago. A valoração do exame criminológico e a progressão de
regime: decisões de execução penal em Minas Gerais, Dissertação (Mestrado em
Direito) — Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, USP, São Paulo, 2018, p. 48.
[2] NUCCI, Guilherme
de Souza. Individualização da pena, 2. ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2007., p. 325.
[3] CARVALHO,
Salo de. O papel da perícia psicológica na execução penal, In: GONÇALVES,
Hebe Signorini; BRANDÃO, Eduardo Ponte (Orgs.). Psicologia jurídica no
Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2011, p. 183.
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