TRF-3 aplica tráfico privilegiado a casal acusado de ser "mula" em cruzeiro
12 de
outubro de 2022, 7h31
A função das "mulas" do tráfico é necessária para o êxito da cadeia logística do transporte de drogas, principalmente quando o destino dos entorpecentes for o exterior. Porém, isso nem sempre significa que elas integram a organização criminosa supostamente responsável pela remessa ilícita, sendo cabível o reconhecimento do tráfico privilegiado.
A 11ª Turma do Tribunal Regional
Federal da 3ª Região (TRF-3) adotou esse entendimento por unanimidade ao dar
provimento ao recurso de apelação da defesa de um casal de argentinos. Os réus
foram condenados por tráfico internacional, sem a aplicação da minorante do
parágrafo 4º, do artigo 33, da Lei 11.343/2006.
Com a decisão, o colegiado reduziu a
pena dos recorrentes de cinco anos, oito meses e um dia de reclusão para quatro
anos, dez meses e dez dias. A diminuição da sanção refletiu no abrandamento do
regime inicial de cumprimento da sanção, também requerido no recurso defensivo
(indo do fechado para o semiaberto).
O advogado Diego dos Anjos Elias Antônio
sustentou em seu recurso que os clientes fazem jus à diminuição da pena, de um
sexto a dois terços, por preencherem os requisitos previstos na Lei de Drogas:
ser primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas
e nem integrar organização criminosa.
"Os réus são primários, não
registram maus antecedentes e não há provas de que se dediquem a atividades
criminosas, não se podendo afirmar que integrem, ainda que circunstancialmente,
organização criminosa voltada ao tráfico transnacional de drogas. Trata-se de
situação de 'mula' do tráfico", analisou o desembargador Nino Toldo.
Relator da apelação, Toldo
classificou como imprescindível o papel das "mulas" na
cadeia delitiva de uma organização criminosa. "Contudo, não se pode dizer
que toda 'mula' integra tal organização, devendo haver análise caso a
caso". Para o relator, na hipótese dos autos, tudo indica que o
envolvimento dos réus tenha sido pontual.
O desembargador também ressalvou que,
embora tenham importância na logística criminosa, as "mulas" são
contratadas apenas para levar o tóxico, "sem ter nenhum poder de ingerência
sobre como realizarão esse transporte, nem onde e de quem receberão a droga,
cabendo-lhes obedecer a ordens e seguir roteiro previamente estabelecido".
Cruzeiro europeu
Com 5,5 quilos de cocaína presos com fita adesiva ao corpo, o casal tentou
embarcar no navio MSC Preziosa, no terminal de passageiros do Porto de Santos,
para um cruzeiro com destino final à Espanha, em abril. A droga foi descoberta
durante fiscalização de rotina, sendo os apelantes presos em flagrante pela
Polícia Federal.
Ao condenar o casal, no dia 6 de
julho, o juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal de Santos, não
reconheceu o tráfico privilegiado, "em razão da conduta ter se concretizado,
por certo, em ação orquestrada e executada pelos acusados e terceiros não
identificados, em ações próprias às desenvolvidas por organizações
criminosas".
Segundo o advogado Diego Elias, não
há prova nos autos de que os acusados se dediquem a atividades criminosas e
integrem organização criminosa internacional, sendo “sensível e atenta” a
análise do relator. "Os apelantes apenas foram contratados como 'mulas',
sem maiores detalhes sobre o transporte e cabendo-lhes somente cumprir ordens
prévias".
O argentino admitiu em juízo que
ganharia US$ 1 mil (cerca de R$ 5,2 mil na cotação atual) para levar o
entorpecente à Europa. Informou ter recebido a droga em Santos de um homem que
identificou apenas por "Leandro". Ainda segundo ele, a sua namorada soube
do transporte ilícito que faria apenas no momento da entrega da cocaína.
O réu alegou que aceitou a proposta
de transportar a droga porque precisava de dinheiro para pagar a pensão
alimentícia dos filhos. A acusada confirmou a versão do namorado e disse que
aceitou participar do esquema "por amor". O homem e a mulher traziam
presos aos corpos, respectivamente, 2,8 e 2,7 quilos de cocaína.
Processo 5002078-09.2022.4.03.6104
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