Assunção de culpa em ANPP não basta para embasar condenação de corréu
21 de
setembro de 2022, 18h04
A assunção extrajudicial de culpa no
acordo de não persecução penal (ANPP) não tem capacidade probatória para,
por si só, levar à condenação. Para isso, é imprescindível sua reprodução em
juízo, durante a ação penal, e a constatação de sua coerência com provas
judicializadas, submetidas ao contraditório.
Com esse entendimento, a 6ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem em Habeas Corpus para absolver
José Francisco Martha, o Zé da Doca, da condenação a dois anos, três meses e
seis dias de reclusão, em regime inicial aberto, pelo crime de falsidade
ideológica em continuidade delitiva.
Segundo a denúncia, enquanto era
prefeito de São Sebastião da Grama (SP), ele e outras pessoas participaram de
aquisições de notas fiscais falsas para justificar adiantamentos de valores de
viagens com o propósito de "acertar o caixa".
Na fase extrajudicial, alguns dos
suspeitos assinaram um termo de acordo de não persecução penal, que oferece ao
acusado de um crime a possibilidade de evitar o processo penal mediante
reparação de danos, prestação de serviços comunitários e outras medidas menos
gravosas.
Um dos requisitos para fazer jus ao
ANPP é confessar o ilícito. As informações fornecidas por esses suspeitos
foram, então, usadas pela acusação como prova do envolvimento do prefeito no
crime, mas esses elementos extrajudiciais não foram reproduzidos na fase
processual, ao longo da instrução criminal
Relator no STJ, o ministro Rogerio
Schietti afirmou que as declarações feitas na fase extrajudicial não têm
standard probatório para, exclusivamente, levar à condenação. "Seja qual
for a sua clareza, deve ser confrontada com outros elementos que possam
confirmá-la ou contraditá-la, durante a instrução criminal."
De acordo com o ministro, se o
suspeito que celebra ANPP não pode ter suas declarações usadas contra si
na seara criminal (ao menos enquanto não descumprir os termos do acordo), então
essa prova também não deve servir para subsidiar a condenação de outros réus.
"A verdade judicial traduzida na
sentença precisa ser uma verdade processual. Para que a declaração do celebrante
do ANPP possa respaldar o decreto condenatório, é imprescindível sua reprodução
em juízo, durante a ação penal, e a constatação de sua coerência com provas
judicializadas, submetidas ao contraditório, de forma a conferir ao réu o
direito fundamental de efetiva participação na formação da decisão judicial, em
dualidade com o Ministério Público." A votação foi unânime.
REsp 756.907
Danilo Vital é correspondente da
revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico,
21 de setembro de 2022, 18h04
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