STJ vê possível estelionato em grupo acusado de explorar pirâmide financeira
21 de
setembro de 2022, 19h47
A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a ação penal por
crime contra a economia popular e por estelionato contra um grupo acusado de
operar esquema de pirâmide financeira envolvendo investimentos em criptomoedas.
O grupo responde também por lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Ao dar provimento parcial ao recurso
em Habeas Corpus de um dos acusados (decisão estendida aos corréus), a turma
apenas afastou a imputação de estelionato pelos prejuízos genéricos causados a
um número indeterminado de vítimas cooptadas por meio da internet – ainda que
algumas delas tenham sido identificadas.
Seguindo o voto do relator, ministro
Ribeiro Dantas, o colegiado entendeu que a denúncia baseada em acusações
genéricas de cooptação de vítimas pela internet não caracteriza delitos
autônomos de estelionato. A decisão tem como objetivo evitar a dupla punição
dos réus pelo mesmo fato (princípio do non bis in idem).
De acordo com o processo, o grupo
acusado utilizava uma plataforma eletrônica, chamada Vik Traders, para atrair
investidores com a promessa de ganhos acima da média, por meio de compra e
venda de criptomoedas. Eles disponibilizavam alguns resgates iniciais, mas logo
as vítimas deixavam de receber os valores investidos.
Também era simulada uma operação de
marketing multinível, vinculando a participação no negócio à atração de novos
investidores.
O Ministério Público acusou o grupo
de crime contra a economia popular (artigo 2º, IX, da Lei 1.521/1951) e também de
estelionato (artigo 171, caput, do Código Penal), pois
houve vítimas identificadas, com seus prejuízos individualizados, e algumas
foram abordadas por aliciadores.
A defesa impetrou habeas corpus
pleiteando o trancamento da ação penal em relação a todas as denúncias de
estelionato, sob o argumento da ocorrência de bis in idem, mas o
pedido foi indeferido. No recurso dirigido ao STJ, a defesa insistiu que a
dupla acusação decorreria do mesmo fato.
O ministro Ribeiro Dantas afirmou
que, enquanto o crime contra a economia popular visa a obtenção de ganhos
ilícitos em detrimento de pessoas indeterminadas, o de estelionato é dirigido
contra o patrimônio individual.
Conforme o ministro, a identificação
das pessoas lesadas de forma genérica e dos prejuízos que elas sofreram pode
vir a ser importante para a avaliação da pena-base em caso de condenação, mas
essa especificação de vítimas "não deve caracterizar infração penal
autônoma, sob pena de dupla punição dos réus pelos mesmos fatos".
Dantas destacou o entendimento da 3ª
Seção, segundo o qual, no crime contra a economia popular, o objetivo não é
enganar vítimas determinadas, mas qualquer um que demonstre interesse no
negócio oferecido. Ele também mencionou julgado recente em que a 6ª Turma
estabeleceu que a mera identificação das vítimas no crime contra a economia
popular não autoriza a responsabilização do agente pela prática simultânea de
estelionato.
O ministro observou ainda que, para a
imputação do estelionato, é necessário que a fraude seja contra o patrimônio de
vítima determinada, diretamente induzida em erro.
Analisando as informações do
processo, Ribeiro Dantas constatou que algumas vítimas, em vez de serem
simplesmente atraídas ao esquema fraudulento pelo site que prometia ganhos
irreais, foram induzidas pessoalmente a entrar na pirâmide financeira por
intermediadores que agiam em nome da empresa investigada, que as convenceram a
adquirir pacotes de criptomoedas.
"Paralelamente ao ato voltado
contra o público em geral (site para angariar vítimas),
verificam-se condutas autônomas de aliciadores voltadas contra o patrimônio
particular de vítimas específicas", apontou o ministro ao reconhecer a
possibilidade, em tese, do concurso de crimes entre o delito contra a economia
popular e o estelionato. Com informações da assessoria de imprensa do
Superior Tribunal de Justiça.
RHC 161.635
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