Lei Maria da Penha se aplica a maus tratos de pai contra filha menor
6 de
junho de 2022, 21h59
A presunção de hipossuficiência da
mulher, implicando a necessidade de o Estado oferecer proteção especial
para reequilibrar a desproporcionalidade, constitui-se em pressuposto de
validade da Lei Maria da Penha.
Com base nesse entendimento, a 15ª
Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a
condenação de um homem por maus tratos contra a filha de 12 anos. A pena é de
três meses e três dias de detenção, em regime inicial aberto, concedida a
suspensão pelo prazo de dois anos.
De acordo com os autos, o réu tinha a
guarda da filha havia sete anos. Um dia, após suspeitar que a menina possuía um
perfil secreto no Instagram para se comunicar com a mãe, o acusado acabou
agredindo a filha com um cinto. Ela sofreu lesões na perna esquerda,
comprovadas por perícia médica.
Em juízo, o pai disse que sua
intenção era de bater com o cinto no chão, para "repreender" a filha
por supostamente manter o perfil secreto. Porém, segundo o réu, ao bater com o
cinto no chão, acabou atingindo a perna da filha. Ele disse que logo se
arrependeu e se desculpou pelo ocorrido. A menina confirmou as agressões em
juízo e disse que o pai a atingiu várias vezes com o cinto.
De início, o relator, desembargador
Willian Campos, rejeitou o pedido do réu para afastar a aplicação dos preceitos
da Lei Maria da Penha. "Isso porque bem caracterizada a violência de
gênero exigida pela Lei Maria da Penha, uma vez que a vítima foi agredida por
seu genitor no âmbito familiar", afirmou.
Segundo o magistrado, a vítima estava
sob a guarda judicial do réu e ambos viviam sob o mesmo teto, sendo
incontestável o vínculo entre a conduta criminosa e a relação familiar. E,
ainda que assim não fosse, Campos disse que os elementos de prova colhidos
revelam a vulnerabilidade da vítima.
"Os maus tratos perpetrados pelo
réu estão comprovados pela confissão judicial do réu, pelas declarações da
vítima e testemunhas, corroboradas pelo boletim de ocorrência, pelas
fotografias e pelo laudo pericial, que constatou a presença de equimoses
amarelo e esverdeadas em toda a face lateral do membro inferior esquerdo da
vítima, compatíveis com histórico de agressão com cinta, concluindo pela
existência de lesões corporais de natureza leve", disse Campos.
O relator também destacou que, em
crimes cometidos no âmbito doméstico e familiar, a palavra da vítima possui
especial relevância, pois os delitos costumam ser cometidos longe de testemunhas,
aproveitando-se o agressor do vínculo que mantém com a vítima.
"A alegação da defesa de
ausência de dolo, pois as 'cintadas' teriam sido direcionadas ao chão, não deve
prosperar. As lesões constatadas na vítima demonstram claramente que as investidas
não foram acidentais. À evidência que o réu, ao agredir violentamente a
adolescente com golpes de cinta, embora com animus corrigendi, extrapolou os
meios necessários para tanto, colocando em risco a integridade física da
infante, tanto que lhe provocou ferimentos", concluiu. A decisão foi
unânime.
Processo
1504114-98.2019.8.26.0564
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