sexta-feira, 29 de outubro de 2021

 

STF
 Injúria racial é crime imprescritível, decide STF

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira (28), que o crime de injúria racial configura um dos tipos penais de racismo e é imprescritível. Por maioria de votos, o colegiado negou o Habeas Corpus (HC) 154248, em que a defesa de uma mulher condenada por ter ofendido uma trabalhadora com termos racistas pedia a declaração da prescrição da condenação, porque tinha mais de 70 anos quando a sentença foi proferida.

Injúria qualificada
L.M.S., atualmente com 80 anos, foi condenada, em 2013, a um ano de reclusão e 10 dias-multa pelo juízo da Primeira Vara Criminal de Brasília (DF) por ter ofendido uma frentista de posto de combustíveis, chamando-a de “negrinha nojenta, ignorante e atrevida”. A prática foi enquadrada como crime de injúria qualificada pelo preconceito (artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal). Ao analisar recurso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o crime de injúria racial seria uma categoria do crime de racismo, que é imprescritível.

Equivalência
Em voto apresentado em novembro de 2020, o relator do HC, ministro Edson Fachin, concordou com o entendimento do STJ e negou o habeas corpus. Segundo o ministro, com a alteração legal que tornou pública condicionada (que depende de representação da vítima) a ação penal para processar e julgar os delitos de injúria racial, o crime passou a ser equivalente ao de racismo e, portanto, imprescritível, conforme previsto na Constituição Federal (artigo 5º, inciso LXII).

Prescrição
Único a divergir, o ministro Nunes Marques considerou que os crimes de racismo e injúria racial não se equiparam, o que possibilita a decretação da prescrição.

Crime inafiançável
Em voto-vista apresentado nesta tarde, o ministro Alexandre de Moraes observou que a Constituição é explícita ao declarar que o racismo é crime inafiançável, sem fazer distinção entre os diversos tipos penais que configuram essa prática. O ministro lembrou que, segundo os fatos narrados nos autos, a conduta praticada por L.M.S. foi uma manifestação ilícita, criminosa e preconceituosa em relação à condição de negra da vítima. “Como dizer que isso não é a prática de racismo?”, indagou.

Inferiorização da vítima
Segundo ele, não é possível reconhecer a prescrição em um caso em que foi demonstrado que a agressora pretendeu, claramente, inferiorizar sua vítima. Ele considera necessário interpretar de forma plena o que é previsto pela Constituição quanto ao crime de racismo, incluindo a imprescritibilidade, para produzir resultados efetivos para extirpar essa prática, “promovendo uma espécie de compensação pelo tratamento aviltante dispensado historicamente à população negra no Brasil e viabilizando um acesso diferenciado à responsabilização penal daqueles que, tradicionalmente, vêm desrespeitando os negros”, afirmou.

Racismo estrutural
No mesmo sentido, o ministro Luís Roberto Barroso observou que, embora com atraso, o país está reconhecendo a existência do racismo estrutural. Ele salientou que não são apenas as ofensas, pois muitas vezes a linguagem naturalizada embute um preconceito. “Não podemos ser condescendentes com essa continuidade de práticas e de linguagem que reproduzem o padrão discriminatório”, disse.

Também para a ministra Rosa Weber, as ofensas decorrentes da raça, da cor, da religião, da etnia ou da procedência nacional se inserem no âmbito conceitual do racismo e, por este motivo, são inafiançáveis e imprescritíveis.

Dignidade
No mesmo sentido, a ministra Cármen Lúcia considera que, nesse caso, o crime não é apenas contra a vítima, pois a ofensa é contra a dignidade do ser humano. Ela ressaltou que, de acordo com o Atlas da Violência, em 2018, os negros foram 75,7% das vítimas de homicídio. “Vivemos numa sociedade na qual o preconceito é enorme, e o preconceito contra pessoas negras é muito maior”, apontou.

Tratados internacionais
O ministro Ricardo Lewandowski salientou que a Constituição, ao estabelecer que a prática de racismo é imprescritível, não estipulou nenhum tipo penal. Segundo ele, isso ocorre porque, ao longo do tempo, essas condutas criminosas se diversificam e é necessário que os delitos específicos sejam definidos pelo Congresso Nacional. Lewandowski também lembrou que o Brasil é signatário de tratados e convenções internacionais em que se compromete a combater o racismo.

O ministro Dias Toffoli também acompanhou o entendimento pela imprescritibilidade do delito de injúria racial.

Efetividade das normas
Para o ministro Luiz Fux , presidente do STF, a discussão sobre a questão racial veio se desenvolvendo para assegurar proteção às pessoas negras e vem passando por uma série de mutações, alcançando uma dimensão social, e não meramente biológica. “As normas constitucionais dessa sociedade, que já foi escravocrata durante 400 anos e um péssimo exemplo para todo o mundo, só se podem tornar efetivas através não só da previsão em abstrato, mas da punição”, afirmou.

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Falta de realização de audiências de custódia

 


STF
 2ª Turma do STF concede HCs em razão da falta de realização de audiências de custódia

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) deu provimento a agravos regimentais apresentados nos Habeas Corpus (HCs) 202579 e 202700, de relatoria do ministro Nunes Marques, para assentar o entendimento de que a realização da audiência de instrução e julgamento e a eventual prolação de sentença condenatória não afastam a ilegalidade resultante da não realização de audiência de custódia.

Em seu voto, o relator reiterou seu entendimento de que os atos posteriores tornam superada a alegação de ausência de audiência de custódia. Para o ministro Gilmar Mendes, que abriu a divergência, a não realização da audiência de custódia caracteriza ilegalidade, já que ela funciona como mecanismo essencial de controle legal e de abusos de autoridades policiais, evitando prisões ilegais.

Finalidades distintas
Segundo ele, a audiência de custódia e a de instrução e julgamento têm finalidades distintas e não podem ser confundidas. Em sua opinião, a relativização da necessidade de sua realização acabaria por esvaziar o cumprimento efetivo do direito fundamental do preso e, implicitamente, poderia passar a mensagem inadequada aos operadores do sistema criminal, no sentido de sua dispensa. Mendes votou, assim, para determinar a realização do procedimento em 24 horas, a contar da comunicação do julgamento.

A divergência foi acompanhada pelo ministro Ricardo Lewandowski. Para ele, não é possível afastar a exigência da realização da audiência de custódia, não só porque se trata de ato completamente distinto, em natureza jurídica e finalidade, dos que disciplinam a instrução criminal, como, também, por ser medida que assegura a higidez da prisão cautelar e o respeito aos direitos fundamentais da pessoa submetida à custódia do Estado.

Circunstâncias específicas
O ministro Edson Fachin acompanhou o relator, por considerar que, nos dois casos, há circunstâncias específicas que devem ser analisadas em cotejo com o princípio da duração razoável do processo, já que houve audiências de instrução e julgamento, interrogatórios dos réus e, em um deles, prolação de sentença condenatória. Como houve empate, a decisão adotada foi a mais benéfica aos réus.



Processo relacionado: HC 202579

sexta-feira, 22 de outubro de 2021

 

STJ
 Período de livramento condicional deve ser computado no cálculo de extinção da pena

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o prazo de livramento condicional deve ser computado para a extinção da pena, observado o tempo máximo de cumprimento previsto no artigo 75 do Código Penal, independentemente de a condenação ter sido menor ou maior do que esse limite. "Um dia em livramento condicional corresponde a um dia em cumprimento de pena privativa de liberdade, exceto em hipótese de revogação", afirmou o ministro Joel Ilan Paciornik, relator do caso julgado.

O colegiado manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que, computando o período de condicional, declarou extinta a pena de um condenado por latrocínio, por ter alcançado o limite de 30 anos previsto pelo artigo 75 do CP na época dos fatos (antes do Pacote Anticrime).

Em recurso ao STJ, o Ministério Público estadual alegou que o cômputo do prazo para a extinção da pena deveria considerar apenas o período em que o apenado esteve recolhido ao sistema prisional, ou seja, não abrangeria o tempo que passou em condicional.

Segundo o MP, o apenado iniciou em 7 de agosto de 1992 o cumprimento da pena total de 34 anos e seis meses de reclusão, mas não chegou a cumprir a pena carcerária por 30 anos, pois está em condicional desde 2 de julho de 2011.

Prazo do livramento condicional é o restante da pena
O relator, ministro Joel Ilan Paciornik, explicou que o livramento condicional é regulado no Código Penal (artigos 83 a 90) e na Lei de Execução Penal – LEP (artigos 131 a 146), e deve ser aplicado ao apenado para que ele fique solto, mediante condições, por tempo determinado, denominado "período de prova" (artigo 26, II, da LEP). Ultrapassado o período de prova, ou seja, se o livramento condicional não for revogado, encerra-se seu período, sendo extinta a pena privativa de liberdade, conforme o CP e a LEP.

De acordo com o magistrado, embora a lei não traga previsão expressa do prazo de duração da condicional, é pacífica a compreensão de que o tempo do benefício corresponderá ao mesmo tempo restante da pena privativa de liberdade a ser cumprida.

"Assim, exemplificando, o apenado em 15 anos de reclusão que obtiver o livramento condicional após dez anos de cumprimento da pena privativa de liberdade terá período de prova estipulado em cinco anos. Cumpridos cinco anos de livramento condicional sem revogação, a pena privativa de liberdade será extinta", disse.

Efeitos da condicional devem ser os mesmos para todos
No caso em análise, o relator verificou que o condenado teve a pena estabelecida em montante superior ao limite de 30 anos admissível para cumprimento de pena vigente ao tempo dos fatos (artigo 75 do CP). O livramento condicional foi concedido após, aproximadamente, 19 anos de cumprimento.

A controvérsia, ressaltou, estava em definir se o período de prova deveria ser de 11 anos (observando-se o limite legal para a privação de liberdade) ou prazo superior (observando-se a pena total).

Para o ministro, por não haver resposta expressa no regramento legal, a solução requer a aplicação dos princípios da isonomia e da razoabilidade. Com base neles, o relator concluiu que "o instituto do livramento condicional deve produzir os mesmos efeitos para quaisquer dos apenados que nele ingressem, e tais efeitos não devem ser alterados no decorrer do período de prova, ressalvado o regramento legal a respeito da revogação, devendo o término do prazo do livramento condicional coincidir com o alcance do limite do artigo 75 do CP".

Benefício é forma de cumprimento da pena
Paciornik observou ainda que o Código Penal trata do livramento condicional em capítulo específico (Capítulo V) ao discorrer a respeito das penas (Título V), de forma desvinculada das penas privativas de liberdade (Capítulo I, Seção I). Entretanto, a LEP trata do livramento condicional na Seção V, dentro do Capítulo I, que é relativo às penas privativas de liberdade.

"Essa análise ampara uma interpretação no sentido de que o livramento condicional configura forma de cumprimento das penas privativas de liberdade, embora as condicionantes sejam restritivas de liberdade, consoante dispõe o artigo 132 da LEP", destacou.

Leia o acórdão no REsp 1.922.012.

REsp1922012

quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Extradição após Pacote Anticrime

 

STF
 1ª Turma do STF firma entendimento a respeito de extradição após Pacote Anticrime

Por maioria dos votos, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que, para fins de extradição, o estado estrangeiro se comprometa a estabelecer pena máxima de 30 anos para o cumprimento de pena de extraditandos que praticaram crimes até 24/12/2019, quando o Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) foi sancionado. O artigo 75 do Código de Penal (CP) previa que o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não poderia ser superior a 30 anos. Com o advento da Lei 13.964/2019, este prazo foi ampliado para 40 anos.

Irretroatividade

O entendimento foi fixado nesta terça-feira (19) no julgamento da Extradição (EXT) 1652. O pedido foi formulado pelo Governo do Chile contra o seu nacional Francisco Javier Zavala Díaz, acusado dos crimes de roubo e falsificação de documento praticados em 2016 e 2017.

A relatora, ministra Rosa Weber, verificou a existência dos requisitos necessários ao deferimento da extradição: a dupla tipicidade e a dupla punibilidade (a conduta ser considerada crime nos dois países). Com fundamento no princípio constitucional da irretroatividade da lei mais gravosa, a ministra observou que o tempo máximo de cumprimento da pena deve ser definido em 30 anos, uma vez que os fatos pelos quais o extraditando está sendo investigado ocorreram antes da alteração do Pacote Anticrime, em 2019.

Ao votar pelo deferimento da extradição, a ministra Rosa Weber condicionou a entrega do chileno à extinção de ação penal em curso na justiça brasileira, ressalvada eventual manifestação expressa do presidente da República em sentido contrário e observados os compromissos previstos no artigo 96 da Lei de Migração (Lei 13.445/2017), assumidos pelo Governo do Chile.

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

 

STJ
 Para Quinta Turma, configuração do crime tentado exige início da ação prevista no verbo do tipo penal

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que, para se configurar a modalidade tentada de um crime, é necessário que o agente comece a praticar a ação descrita pelo verbo correspondente ao núcleo do tipo penal.

Com esse entendimento, os ministros negaram provimento ao recurso em que o Ministério Público do Tocantins buscava a condenação de dois homens por tentativa de roubo. Eles foram flagrados pela polícia com uma arma de fogo, após romperem o cadeado e destruírem a fechadura de uma residência com o objetivo de roubá-la.

Para o colegiado, no entanto, a ação dos dois configurou meros atos preparatórios – o que impede a condenação por tentativa de roubo circunstanciado, uma vez que não iniciaram a ação de "subtrair", núcleo verbal do artigo 157 do Código Penal.

Divergência sobre a configuração do crime tentado
O relator, ministro Ribeiro Dantas, destacou que, segundo o artigo 14, II, do Código Penal, o crime é considerado tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. "O texto legal é muito aberto, não trazendo maior clareza ou precisão a respeito de algo que concretamente possa indicar quando a execução de um crime é iniciada, talvez por não se tratar de uma missão humanamente simples, sendo ela objeto de debates também em outros países", ponderou.

Segundo o magistrado, a doutrina de Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli entende que o problema mais crítico da tentativa é determinar a diferença entre os atos executivos e os preparatórios. Os autores, afirmou, adotam o chamado critério objetivo-individual, para o qual a tentativa começa com a atividade do agente que, segundo o seu plano concretamente delitivo, se aproxima da realização.

Outra vertente, explicou Ribeiro Dantas, é uma variante do critério objetivo-individual que requer "comportamento manifestado em execução específica do tipo, segundo o plano do autor, numa conexão ou semelhança muito grande com a teoria objetivo-formal, que exige o início da realização do núcleo da norma penal incriminadora". De acordo com o relator, nessa perspectiva, seriam condutas meramente preparatórias dirigir-se ao local da subtração patrimonial (ainda que portando armas), montar mecanismo de arrombamento no local etc.

Não há jurisprudência dominante sobre o tema
Apesar de não haver jurisprudência dominante a respeito da questão, o ministro apontou precedente em que a Terceira Seção analisou o caso de duas pessoas que foram presas, armadas, em frente a uma agência dos Correios e confessaram a intenção de cometer um assalto, depois de terem observado o ponto por alguns dias para saber o horário dos malotes de uma instituição financeira. Por não reconhecer a tentativa de roubo à agência da empresa pública, a seção afastou a competência da Justiça Federal.

Naquele julgamento, destacou Ribeiro Dantas, o colegiado consignou que não se poderia imputar aos réus a prática de roubo circunstanciado tentado, pois em nenhum momento ocorreu o início da conduta tipificada no artigo 157 do Código Penal.

"A despeito da controvérsia doutrinária e da abertura legal, o que afasta a existência de uma única resposta certa para fixar o entendimento jurídico sobre a matéria, parece ser possível empregar o mesmo raciocínio do julgado acima transcrito, entendendo que esta corte tem a tendência de seguir a corrente objetivo-formal, exigindo o início da prática do verbo correspondente ao núcleo do tipo penal para a configuração da tentativa", concluiu.

Leia o acórdão no AREsp 974.254.

AREsp974254

quinta-feira, 7 de outubro de 2021

 

STJ
 É incabível a realização de interrogatório virtual de réu foragido, decide Sexta Turma

A Sexta Tuma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, denegou habeas corpus impetrado por um réu que alegou nulidade do processo por falta de interrogatório, após o indeferimento de sua inquirição de forma virtual enquanto estava foragido.

Relator do habeas corpus, o ministro Sebastião Reis Júnior afirmou que não se aplica ao caso analisado o artigo 220 do Código de Processo Penal – que estabelece que pessoas impossibilitadas por enfermidade ou velhice sejam inquiridas onde estiverem –, pois, como destacado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), isso significaria "premiar a condição de foragido".

O réu teve a prisão preventiva decretada ainda durante o inquérito, sob a acusação de latrocínio e associação criminosa. Além da nulidade, a defesa requereu a revogação da prisão preventiva por excesso de prazo para a conclusão da instrução processual, afirmando que a audiência de instrução e julgamento – quando o réu já estava preso – teve de ser desmarcada três vezes, por falta de transporte.

Em petição na qual comunicou a prisão do acusado, durante a tramitação do habeas corpus, a defesa alegou que o ato seria ilegal devido à não realização de audiência de custódia.

Réu constava como procurado desde a decretação da prisão
Ao proferir seu voto, Sebastião Reis Júnior observou que, desde a decretação da prisão preventiva, o réu não mais havia sido localizado, passando a constar como procurado. No entender do ministro, não é possível aplicar à sua situação o artigo 220 do CPP, já que ele não se enquadra nas hipóteses de incidência da norma – velhice ou enfermidade.

Acerca do excesso de prazo, o relator disse que o TJSP considerou justificada a remarcação de audiências e afastou a alegada desídia do juízo de primeiro grau. Para o ministro, os fundamentos da prisão cautelar já foram exaustivamente examinados e mantidos em outros habeas corpus, inclusive com base na gravidade concreta do crime supostamente praticado.

Ao negar o habeas corpus, Sebastião Reis Júnior observou ainda que as alegações de nulidade da prisão, por falta da audiência de custódia, "devem ser suscitadas em autos próprios, perante o juízo competente".


Leia o acórdão no HC 640.770.

 

STF
 Ministro Gilmar Mendes determina soltura de condenado apenas com base em reconhecimento fotográfico

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a soltura de R.R.S., condenado por roubo tendo como prova apenas o reconhecimento fotográfico realizado, inicialmente, por meio do aplicativo WhatsApp. A decisão liminar foi proferida no Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 206846.

WhatsApp

De acordo com os autos, quatro pessoas tiveram um par de óculos, uma carteira, um aparelho celular, um relógio e R$ 100 roubados por três homens numa avenida em São Paulo (SP). Uma hora após o crime, R.R.S. foi abordado por um policial, que o fotografou e, pelo WhatsApp, enviou a imagem aos policiais que estavam com as vítimas, que o reconheceram. Em seguida, ele foi levado à delegacia, onde foi feito o reconhecimento pessoal, renovado em juízo, o que resultou em sua condenação a oito anos, dez meses e 20 dias de reclusão, por roubo com arma de fogo e em concurso de agentes.

Presunção de inocência

Após a condenação, a Defensoria Pública da União (DPU) apresentou habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que indeferiu o pedido. No recurso apresentado ao STF, a DPU sustenta que o condenado, em momento nenhum, foi tratado como investigado. “Desde a abordagem policial, fora dado por culpado e teve furtado de si o constitucional pressuposto da presunção de inocência”, argumenta.

Situação de dúvida

Em sua decisão, o ministro observou que, embora se trate de um RHC substitutivo de revisão criminal, a liminar deve ser deferida, em razão da aparente ilegalidade verificada no reconhecimento fotográfico pré-processual. Ainda que seja possível que os agentes tenham se separado e dispensado os objetos roubados e a arma antes da chegada da polícia, o ministro ressaltou que nenhum outro elemento corrobora as declarações das vítimas, que afirmaram reconhecer o suspeito, inicialmente, por foto recebida via WhatsApp.

Mendes também destacou que não há nos autos nenhuma explicação para que R.R.S. tenha sido fotografado na abordagem, já que nada fora encontrado com ele. A falta de outros elementos que corroborem os depoimentos das vítimas, a seu ver, gera “uma situação de dúvida”.

Reconhecimento viciado

Segundo o ministro, o caso é semelhante a um precedente julgado na Primeira Turma do STF (RHC 176025), em que o colegiado decidiu que o reconhecimento fotográfico, mesmo quando confirmado em juízo, não é prova idônea para fundamentar uma condenação se não houver outros elementos probatórios. No seu entendimento, a DPU tem razão ao afirmar que, no caso concreto, o reconhecimento judicial está viciado pelo reconhecimento fotográfico realizado por WhatsApp, somado ao fato de que não há nenhuma outra prova que confirme a autoria do delito.

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

 


STJ
 Baseada em novo entendimento, Sexta Turma anula provas obtidas em invasão policial na casa do suspeito

Com fundamento em recente precedente do colegiado, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou as provas obtidas pela polícia após a invasão do domicílio de um suspeito de tráfico de drogas. Por unanimidade, os ministros acolheram o pedido da defesa, segundo a qual a polícia entrou na casa sem autorização.

De acordo com o entendimento da Sexta Turma no Habeas Corpus 598.051, a autorização do morador para ingresso em domicílio, quando não houver mandado judicial, deve ser registrada pelos policiais em áudio e vídeo, para não haver dúvida acerca desse consentimento nem da legalidade da ação. Além disso, a entrada deve ter fortes razões que a justifiquem, não bastando a referência à desconfiança policial ou mera atitude suspeita.

Segundo o processo, a polícia foi até a residência do suspeito a partir de denúncias anônimas de que ele estaria traficando e cultivando maconha no local. Os policiais alegaram ter avistado uma estufa por cima do muro de uma casa vizinha e sentido forte cheiro de maconha.

Essa foi a justificativa para a entrada na residência do vizinho, a partir da qual a polícia acessou o imóvel do suspeito. Os policiais apreenderam mudas e plantas grandes de maconha, sacolas de planta já seca e uma balança de precisão, entre outros objetos – provas que fundamentaram a condenação por tráfico de drogas.

O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) considerou legal o ingresso da polícia nas residências, a partir da informação de que os agentes teriam sido autorizados pelos moradores e agido em situação de flagrância de crime permanente.

Polícia teve a oportunidade de solicitar mandado judicial
O ministro Antonio Saldanha Palheiro, relator no STJ, afirmou que essas razões não sustentam o ingresso forçado na casa onde foram apreendidas as drogas, pois, diante das denúncias, seria possível que a polícia solicitasse um mandado judicial.

"Conforme declarado pelos próprios agentes, houve diversas denúncias de que na residência se praticava o tráfico de drogas, além de ser possível visualizar a estufa de fora da casa, circunstâncias que demonstram ser plenamente possível a solicitação de mandado judicial para busca e apreensão, o que não ocorreu" – observou o relator, considerando que nada indicava a urgência do ingresso no imóvel.

Para o magistrado, a decisão do TJPR foi contrária ao mais recente entendimento da Sexta Turma do STJ, segundo o qual o consentimento para ingresso dos policiais sem mandado deve ser comprovado pelo Estado. Além disso, não se verificou a justa causa para a ação policial, pois, em conformidade com aquele precedente, a invasão domiciliar sem mandado exige uma situação anterior que leve à conclusão sobre a ocorrência de crime no local e sobre a necessidade de sua interrupção imediata.

Ao reforçar o entendimento pela anulação das provas, Antonio Saldanha Palheiro destacou que os policiais também entraram na residência vizinha sem o consentimento comprovado do morador – fato que, por si só, já seria suficiente para gerar a nulidade de todos os atos seguintes, em razão da teoria dos frutos da árvore envenenada.

Leia o acórdão no HC 561.988.

HC561988