terça-feira, 31 de agosto de 2021

Aplicação Retroativa de Norma

 

TRF-1 faz aplicação retroativa de norma sobre dinheiro não declarado no exterior

Firmando leading case sobre a matéria, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região acolheu embargos de declaração em apelação criminal para absolver um réu da prática do delito de manutenção de depósitos não declarados no exterior, previsto no artigo 22, parágrafo único da Lei 7.492/86, em razão da superveniência da Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) 4.841, de 2020.

Decisão é da 4ª Turma do TRF-1 
TRF-1

Segundo os autos, o réu foi condenado em 2015 pela suposta manutenção de cerca de US$ 995 mil em território estrangeiro, sem a devida declaração à repartição federal competente.

Mas, em 1º de setembro de 2020, entrou em vigência a resolução do CMN, que determinou, em seu artigo 2º, que pessoas físicas e jurídicas residentes, domiciliadas ou com sede no país somente estarão obrigadas a apresentar anualmente ao Banco Central declaração de bens e valores mantidos no exterior que, na data-base de 31 de dezembro, alcancem ou superem a quantia de US$ 1 milhão. O limite anterior era de US$ 100 mil.

Nesse contexto, já em segunda instância, a defesa opôs embargos de declaração, alegando que o artigo 22 da Lei 7.492/86 é norma penal em branco que exige complementação por norma administrativa. Assim, se a norma complementadora se modifica, também se altera a estrutura típica do crime, de tal forma que, sendo mais benéfica ao acusado, deverá retroagir para beneficiá-lo, nos termos do artigo 5º, inciso XL da Constituição Federal e do artigo 2º do Código Penal.

O relator, juiz federal Convocado Saulo José Casali Bahia, acolheu o pleito defensivo formulado pelos escritórios Almeida Castro, Turbay Advogados e Décio Freire Advogados, destacando que o valor mantido no exterior pelo réu é inferior ao estipulado pela nova Resolução do CMN, motivo pelo qual deve ser afastada a sua condenação quanto ao crime de manutenção de depósitos não declarados no exterior. A decisão foi unânime.

0028776-47.2007.4.01.3800

segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Delegacia da Diversidade Online


 Delegacia da Diversidade Online é lançada em São Paulo

Foi lançada na quinta-feira (26) a Delegacia da Diversidade Online que vai atender a denúncias de práticas transfóbicas ou homofóbicas de todo o Estado de São Paulo. A partir da página da Polícia Civil será possível registrar ocorrências de crimes de intolerância ou preconceito pela diversidade sexual. As denúncias também poderão ser feitas presencialmente pela unidade específica na capital paulista e nas unidades do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) em todo o Estado.

Segundo o delegado-geral de polícia, Ruy Ferraz, foi montada uma equipe para atender exclusivamente ao novo serviço de investigação. De acordo com ele, são 26 policiais com quatro viaturas descaracterizadas à disposição. Os agentes receberam treinamento sobre o tema da diversidade. “Nós temos treinamento específico para esses casos e estamos treinando todos os policiais do interior para que atendam com a dignidade que a vítima merece”, enfatizou.

Essa equipe vai ficar responsável por tomar as providências necessárias das ocorrências registradas na capital paulista pelo sistema eletrônico ou presencial. No restante do estado, as investigações serão conduzidas pelos Deics.

O secretário executivo da Polícia Civil, delegado Youssef Abou Chain, disse que há uma expectativa de que a divulgação do novo serviço leve a um aumento da notificação de crimes de intolerância no Estado. “Nós vamos ter com certeza um aumento significativo no número de registros, devido à facilidade e à divulgação do serviço vai encorajar essas denúncias”, disse.

Segundo Chain, nos últimos dois anos, foi registrada em todo o estado uma média de 2 mil crimes de intolerância por ano. Ele ressalvou, no entanto, que até o momento os registros não permitiam a separação da intolerância contra a diversidade sexual de outros delitos de intolerância.

Daniel Mello - Repórter da Agência Brasil - São Paulo
Edição: Aline Leal

Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH)

 

Juízes adotam critério da Corte IDH para calcular pena de presos em locais degradantes

Decisões recentes de magistrados brasileiros mudaram a forma de se calcular o tempo de pena das pessoas privadas de liberdade em condições degradantes. A nova conta se baseia em Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), que decidiu, em 2018, que deverá ser contado em dobro cada dia da punição de pessoas mantidas em um estabelecimento penal do Complexo de Gericinó, em Bangu, no Rio de Janeiro (RJ), sob condições desumanas. A sentença não se aplica para acusados ou condenados por crimes contra a vida (homicídio, por exemplo) e a integridade física (lesão corporal) ou crimes sexuais.

O entendimento foi seguido no julgamento de três presos de Pernambuco, do Pará e de Santa Catarina, cujas penas cumpridas em ambientes degradantes foram contadas em dobro por decisão da Justiça brasileira. A.A.F.S. cumpriu pena no Complexo do Curado, no Recife. O maior conjunto de estabelecimentos prisionais de Pernambuco foi alvo de visita da Corte IDH em 2015, quando foram verificadas violações aos direitos humanos que resultariam em sanções ao Estado brasileiro. Na decisão, em 12 de maio deste ano, a juíza Orleide Roselia Nascimento Silva acolheu o pedido da Defensoria Pública do estado e reconheceu o direito à contagem dobrada dos meses que o preso passou no Curado, entre 2012 e 2016.

Além de remeter à Resolução da Corte IDH, as decisões que adotaram o cálculo em dobro das penas têm em comum a menção à jurisprudência estabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no primeiro semestre deste ano. Em abril, uma decisão do ministro Reynaldo Soares da Fonseca multiplicou por dois o tempo em que o condenado O.O.S. cumpriu pena no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, presídio insalubre que originou a Resolução da Corte Interamericana de 2018.

Um ano antes, violações aos direitos humanos já haviam sido constatadas em visita da Comissão Interamericana de Direitos Humanos no Plácido de Sá Carvalho. Desde então, o Tribunal monitora a situação na unidade prisional com o Estado brasileiro. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou no início deste ano um setor para acompanhar o cumprimento das decisões da Corte, autoridade máxima de direitos humanos da região.

A decisão monocrática do ministro Reynaldo Soares da Fonseca foi confirmada pela 5ª Turma do STJ, em junho. No texto do acórdão, fica evidenciada a competência da Corte IDH em relação à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). Em 2002, por meio do Decreto 4.463, o Brasil sujeitou-se a cumprir todas as decisões da Corte em relação ao país, obrigação a ser cumprida por todos os órgãos e poderes internos do país.

No último dia 13 de agosto, o juiz Flávio Oliveira Lauande, de Santarém (PA), determinou a contagem em dobro da presa R.J.R.B., que passou um ano e 23 dias nas Casas Penais de Santarém. Entre as provas de insalubridade das unidades prisionais, o magistrado elencou superlotação, condições estruturais deficitárias, em especial de iluminação e ventilação, ausência de vagas para trabalho e estudo para todos, ausência de banho de sol e visitas íntimas e ausência de agentes e corpo clínico em número adequado.

“As condições de cumprimento nesta comarca, diante da superlotação, são indignas, degradantes, autorizando a adoção de solução semelhante à apresentada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, como compensação ao descumprimento da LEP, da Constituição e das recomendações da CIDH”, afirmou na sua decisão o magistrado da Vara de Execuções Penais Privativas de Liberdade de Santarém.

A última das três decisões foi proferida no dia 16 de agosto pelo juiz João Marcos Buch, da comarca de Joinville (SC). O preso M.C. está há um ano e cinco meses no Presídio Regional de Joinville, caracterizado como degradante pelo magistrado. “O fato é que, até esta data, o Departamento de Administração Prisional não proporcionou condições razoáveis de cumprimento de pena no Presídio Regional de Joinville, deixando apenados em condições ilegais, repita-se, sem trabalho, sem educação, sem atividade alguma, correndo o risco de serem assassinados, trancafiados em celas superlotadas insalubres, sem ventilação cruzada, 24h por dia, 365 dias por ano, com um par de horas de banho de sol diário, em pátios que se resumem a uma laje circundada por paredões”, afirmou o juiz na decisão.

Conforme relatórios do magistrado, que responde há 10 anos pela execução penal no maior município de Santa Catarina, a unidade prisional tem capacidade de 560 vagas e possui atualmente 1.220 presos e 66 agentes penitenciários. Entre janeiro de 2020 e julho de 2021, foram registrados sete homicídios dentro do estabelecimento.

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias