quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Maratona de Palestras Direito USCS/OAB SCS 2021-1



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OPINIÃO

Stalking é violência psicológica que autoriza uso da Lei Maria da Penha

Por  e 

A Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) constitui um marco na historia do Direito. Como bem aponta Valéria Diez Scarance Fernandes [1]"essa lei rompeu com a noção de que o processo tradicional era suficiente para que a mulher vencesse séculos de inferioridade, discriminação e violência. Mais do que uma lei repressiva, a Lei Maria da Penha recriou o processo penal, dotando-o de mecanismos para proteger a mulher, recuperar o agressor, romper o ciclo da violência nas famílias e assim promover a pacificação social".

O conceito de "violência" [2], premissa da aplicação da Lei Maria da Penha, está invariavelmente sujeito a transformações no tempo. Condutas que eram toleradas em tempos remotos passam a ser vistas hoje sob novas lentes, sendo tidas como atos violadores.

Nesse contexto, a reflexão acerca do stalking, prática cada vez mais presente [3], é fundamental, notadamente para o fim de reconhecer que a mulher vítima dessa espécie de conduta também pode se valer dos mecanismos de proteção da Lei Maria da Penha.

A expressão stalking pode ser traduzida como "perseguição persistente". De acordo com Damásio de Jesus [4]"stalking é uma forma de violência na qual o sujeito ativo invade a esfera de privacidade da vítima, repetindo incessantemente a mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos: ligações nos telefones celular, residencial ou comercial, mensagens amorosas, telegramas, ramalhetes de flores, presentes não solicitados, assinaturas de revistas indesejáveis, recados em faixas afixadas nas proximidades da residência da vítima, permanência na saída da escola ou do trabalho, espera de sua passagem por determinado lugar, frequência no mesmo local de lazer, em supermercados etc. O stalker, às vezes, espalha boatos sobre a conduta profissional ou moral da vítima, divulga que é portadora de um mal grave, que foi demitida do emprego, que fugiu, que está vendendo sua residência, que perdeu dinheiro no jogo, que é procurada pela Polícia etc. Vai ganhando, com isso, poder psicológico sobre o sujeito passivo, como se fosse o controlador geral dos seus movimentos".

A prática do stalking configura a contravenção penal de perturbação da tranquilidade (artigo 65 do Decreto-Lei nº 3.688/41 [5]) e, além disso, permite a aplicação da Lei Maria da Penha [6], uma vez que caracteriza violência psicológica contra a mulher, nos termos do artigo 5º, inciso III, e 7º, inciso II, da Lei nº 11.340/2006.

Mesmo nos casos em que a mulher vítima do stalking não possua vínculo pretérito com o autor das condutas, é possível a aplicação da Lei Maria da Penha, desde que evidenciado, ainda que de forma putativa, a presença de uma relação íntima de afeto entre autor e vítima (artigo 5º, III, da Lei nº 11.343/06).

Dessa forma, é preciso reconhecer que o stalking também constitui forma de violência psicológica contra a mulher, autorizando a vítima a se valer das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha. O deferimento de medidas protetivas nesses casos é uma forma proteger a mulher, de recuperar o agressor, de romper o ciclo da violência e promover a pacificação social, objetivos últimos da Lei nº 11.340/06.

 

[1] FERNANDES, Valéria Diez Scarance. Lei Maria da Penha: O Processo Penal no Caminho da Efetividade. Grupo GEN, 2015.

[2] “A Lei Maria da Penha utilizou o termo “violência” como uma violação a direito da mulher. Assim, a tradicional distinção entre “ameaça” e “violência” (física) deixa de existir quando se trata de violência doméstica e familiar. Essa violência pode ser física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral (art. 7o). Elaborada com base em instrumentos internacionais, a Lei Maria da Penha ampliou as formas de violência definidas na Convenção de Belém do Pará. Nesse instrumento, previa-se tão somente as violências física, se- xual e psicológica, enquanto a Lei Maria da Penha prevê mais duas formas: a moral e a patrimonial”. (FERNANDES, Valéria Diez Scarance. Lei Maria da Penha: O Processo Penal no Caminho da Efetividade. Grupo GEN, 2015. p. 48).

[3] “Estima-se que, nos Estados Unidos, cerca de 1 milhão de mulheres e 400 mil homens foram vítimas de stalking em 2002. Na Inglaterra, a cada ano, 600 mil homens e 250 mil mulheres são perseguidos. Em Viena, desde 1996, existem informes da ocorrência de 40 mil casos; em 2004, em um grupo de mil mulheres entrevistadas por telefone, pelo menos uma em cada quatro foi molestada dessa forma” (JESUS, Damásio E. de. Stalking. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1655, 12 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10846. Acesso em: 20 jan. 2021).

[4] JESUS, Damásio E. de. Stalking. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1655, 12 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10846. Acesso em: 20 jan. 2021.

[5] Idem.

[6] REIS, Rodrigo A. O stalking no ordenamento jurídico brasileiro e a Lei Maria da Penha. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-mai-11/rodrigo-reis-stalking-ordenamento-juridico-brasileiro#:~:text=Muito%20embora%20o%20stalking%20n%C3%A3o,restri%C3%A7%C3%A3o%20da%20liberdade%20da%20v%C3%ADtima

 

BOM COMPORTAMENTO NA PRISÃO

Inadimplemento de multa, por si só, não impede progressão de regime


Por 

O simples descumprimento da pena de multa não constitui óbice ao deferimento da progressão da regime. Com esse entendimento, a 14ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo negou recurso do Ministério Público e autorizou a progressão de regime de um preso mesmo sem o pagamento da multa imposta na sentença. 

Reprodução
Inadimplemento de multa, por si só, não impede progressão de regime

O preso foi autorizado a progredir para o regime aberto por preencher os requisitos legais, conforme decisão do juízo de origem. O MP contestou a decisão porque não houve o pagamento da multa. Ao TJ-SP, a Promotoria alegou que, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, quitar a multa, ainda que de forma parcelada, passou a ser requisito para a progressão de regime.

Contudo, o relator, desembargador, Fernando Torres Garcia, afirmou que a Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal), ao criar o sistema progressivo de cumprimento de pena, estabeleceu, em seu artigo 112, apenas dois critérios para a progressão: o objetivo (cumprimento de certo tempo da pena) e o subjetivo (bom comportamento carcerário).

"Nada, absolutamente nada foi consignado, como requisito legal à promoção, em relação à satisfação da reprimenda pecuniária", disse o desembargador, lembrando que não cabe ao Poder Judiciário a tarefa constitucional de legislar.

Além disso, Garcia observou que o simples descumprimento da pena de multa não impede a progressão de regime, o que ocorre apenas quando o inadimplemento é deliberado: "Apenas o sentenciado que propositadamente, segundo o Supremo Tribunal Federal, frustrar o pagamento da multa estaria impedido de progredir de regime". 

E, segundo o relator, cabe ao Ministério Público a prova desse proposital ou deliberado inadimplemento, o que, no caso dos autos, "nem de longe se viu". "Aliás, no presente caso, nem mesmo se preocupou o agravante em tecer comentários outros a respeito dos verdadeiros requisitos legalmente estabelecidos, limitando-se a enaltecer, sob sua ótica distorcida, a decisão do Colendo Supremo Tribunal Federal", completou.

Por fim, o magistrado destacou que o preso não ostenta qualquer apontamento negativo em seu boletim informativo ou no atestado de comportamento carcerário, o que justifica a progressão para o regime aberto. A decisão se deu por unanimidade.

Processo 0003583-21.2020.8.26.0154

 

ORIENTAÇÃO DO STF

STJ readequa tese e proíbe extinção da punibilidade sem pagamento de multa

Por 

O não pagamento da pena de multa impede o reconhecimento da extinção da punibilidade do réu que já cumpriu a pena privativa de liberdade. O entendimento é da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que fez uma readequação de tese sobre a matéria, em julgamento em 2 de dezembro de 2020.

Relator, ministro Rogerio Schietti Cruz readequou a tese a partir de decisão do STF
José Alberto

O caso foi levado ao colegiado por sugestão da Comissão Gestora de Precedentes do STJ, que reconheceu no quantitativo de recursos sobre o tema uma oportunidade de revisar uma tese fixada em recursos repetitivos julgados em 2015.

Na ocasião, a 3ª Seção tinha pacificado o entendimento de que o réu que cumpre a pena privativa de liberdade tem a extinção da punibilidade decretada mesmo se ainda não pagou a pena de multa.

Apesar da obrigatoriedade de seguir a tese, ela sempre foi contestada nas instâncias ordinárias. Em dezembro de 2018, o Supremo Tribunal Federal decidiu a matéria em controle concentrado de constitucionalidade (ADI 3.150) em sentido contrário.

 A partir daí, ambas as turmas do STJ fizeram adequação para negar a extinção da punibilidade do réu que ainda não pagou a pena de multa. Ainda assim, os recursos continuaram subindo para julgamento, inclusive com pedidos de modulação da chamada "jurisprudência maléfica".

Em dezembro, a 3ª Seção apenas adequou a tese fixada em repetitivos e que, portanto, deveria orientar as decisões das instâncias ordinárias.

Relador, o ministro Rogério Schietti acolheu a tese no sentido de que "na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade".

No STF, ministro Barroso esclareceu que lei não afastou caráter penal da pena de multa
Nelson Jr./SCO/STF

Entendimento
Quando decidiu o repetitivo em 2015, o STJ apontou que a alteração do artigo 51 do Código Penal, trazida pela Lei 9.268/96, passou a considerar a pena pecuniária como dívida de valor e, portanto, de caráter extrapenal. Assim, seria cobrada pela Fazenda Pública.

Ou seja, direito de punir do Estado terminaria ao fim da execução da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos e não englobaria a pena de multa.

Relator da ADI 3.150 no Supremo Tribunal Federal, o ministro Luís Roberto Barroso esclareceu esse ponto: não há como equiparar o valor resultante de uma pena de multa criminal com um débito comum na Fazenda Pública.

Destacou também que a alteração legislativa nem sequer poderia cogitar de retirar da sanção pecuniária o seu caráter de resposta penal, uma vez que a Constituição, ao cuidar da individualização da pena, faz menção expressa à multa, ao lado da privação da liberdade e de outras modalidades de sanção penal.

Clique aqui para ler o acórdão
REsp 1.785.861
REsp 1.785.861

 Presos em flagrante são soltos devido ao prazo de encaminhamento dos autos

Em razão do não cumprimento das normas de audiência de custódia, a 3ª Vara Criminal de Taubaté (SP) determinou a soltura de dois homens presos em flagrante, cujos autos não foram encaminhados ao Juízo competente dentro de 24 horas.

123RF

Os homens foram presos na manhã da última sexta-feira (22/1), por transportarem 47 pinos de cocaína e 14 porções de maconha. A Defensoria Pública do Estado de São Paulo só recebeu contato do cartório judicial ao anoitecer do dia seguinte.

O defensor Saulo Dutra de Oliveira peticionou o relaxamento da prisão em flagrante, já que o Código de Processo Penal prevê o encaminhamento dos autos em até 24 horas. Ele apontou que os custodiados foram mantidos em condições ilegais de aprisionamento e citou também resolução do Conselho Nacional de Justiça e norma correcional do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o tema.

O juiz Anderson da Silva Almeida acolheu os argumentos da Defensoria e concedeu a soltura no mesmo sábado. Além do descumprimento do CPP, o magistrado apontou que "a ausência de apreciação do flagrante no prazo de 24 horas, sem que haja razão excepcional justificável, implica descumprimento das obrigações assumidas pelo Estado brasileiro ao aderir às disposições previstas na Convenção Americana sobre Direitos Humanos". Com informações da assessoria de imprensa da Defensoria Pública de São Paulo.

1500203-21.2021.8.26.0625

 

Projeto revoga possibilidades de redução do prazo de prescrição da pena

O Projeto de Lei 5353/20, de autoria do deputado Carlos Jordy (PSL-RJ), revoga o artigo 115 do Código Penal, que estabelece que o prazo de prescrição da pena será reduzido pela metade quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 anos ou, na data da sentença, maior de 70 anos. A proposta está em discussão na Câmara dos Deputados.

Portanto, com a mudança proposta pelo projeto, o tempo de prescrição continuará sendo o mesmo para crimes cometidos por pessoas entre 18 e 21 anos e acima de 70 anos de idade.

O tempo de prescrição da pena é variável, de acordo com a sentença final. Se o máximo da pena é superior a 12 anos, por exemplo, a prescrição será em 20 anos.

Alterações no comportamento
Jordy ressalta que, desde a última minirreforma do Código Penal, ocorrida em 1984, “foram diversas e profundas as mudanças na dinâmica social do País, com alterações psíquicas e de comportamento, com a noção da vida adulta desde tenra idade e o aumento considerável da expectativa de vida da população”.

“O artigo 115 não mais se justifica ante a maturidade evidente de uma pessoa entre 18 e 21 anos e, de outro giro, com maior longevidade da população quanto aos maiores de 70 anos”, observa o deputado.

Causas impeditivas
O PL 5353/20 também altera o artigo 116 do Código Penal, que trata das causas impeditivas da prescrição, ao acrescentar dois incisos. O primeiro define que passa a ser causa impeditiva da prescrição da pena “enquanto não resolvido incidente de insanidade mental, de falsidade documental ou exceção de suspeição ou de impedimento”. E a segunda alteração, “enquanto não resolvido conflito de atribuições no âmbito do Ministério Público ou de competência judiciária”.

O deputado justificou as alterações no artigo 116, ao lembrar que o texto atual “traz hipóteses que costumeiramente atrasam os processos, incrementando os riscos de prescrição e, por fim, privilegiando a impunidade de criminosos”.

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

STJ suspende cumprimento de pena pelo princípio da insignificância

 

Um homem que furtou objetos avaliados em R$ 55,10 teve o cumprimento da pena suspenso por decisão do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, que levou em conta os precedentes da Corte sobre a aplicação do princípio da insignificância.

O réu furtou de uma residência uma lâmpada, uma tomada, um desinfetante e um sabonete. Foi condenado a dois anos, oito meses e 15 dias de reclusão, em regime inicial semiaberto. A sentença destacou que ele é reincidente, possuindo outras nove condenações pelo crime de furto.

Contra a decisão, a Defensoria Pública de Rondônia impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça estadual, que não conheceu do pedido. Para a Defensoria, a reincidência não impede o reconhecimento da atipicidade material da conduta.

Em novo habeas corpus, desta vez no STJ, a defesa requereu a absolvição do réu ou a suspensão da condenação até o julgamento final do pedido.

Sem violência

O presidente do STJ destacou que a conduta do réu não conteve agressividade e que ele praticou um furto de bagatela.


"Considerando que o paciente não agiu com violência e que não consta que agiu em qualquer outro momento com violência; considerando o valor insignificante dos objetos; considerando o conjunto de precedentes favoráveis sobre esse tema, ao ponto de excluir a própria tipicidade da conduta, defiro parcialmente a liminar unicamente para suspender o cumprimento da pena", concluiu.

O mérito do habeas corpus será examinado pela Sexta Turma, sob a relatoria da ministra Laurita Vaz.


Leia a decisão.


HC638810

TRF1 permite a aplicação de prova emprestada para assegurar o direito ao contraditório

 

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deferiu o pedido de um investigado para juntar aos autos prova testemunhal produzida em outro processo. O habeas corpus foi impetrado buscando a reforma da decisão que indeferiu o pedido de compartilhamento de prova testemunhal produzida em outro processo que versa sobre os mesmos fatos.

Informações dos autos mostram que o requerente é investigado por irregularidade praticada quando foi membro de uma comissão de licitação. No pedido, justificou a necessidade de prova emprestada alegando ser imprescindível para a apuração da verdade dos fatos e demonstrar sua inocência. O juízo de 1ª Grau entendeu que a defesa não apontou qualquer fundamento de que havia na prova testemunhal, colhida em outro processo, elementos que demonstrem a inocência ou que beneficiasse de alguma forma o acusado.


Durante a análise do caso, o relator, juiz federal convocado Leão Aparecido Alves, afirmou assistir razão ao investigado no direito ao compartilhamento pretendido. "Não procede a alegação de que seria necessário que o interessado seja parte em ambos os processos. No presente caso, verifica tratar-se de autos desmembrados daqueles dos quais se busca emprestada a prova testemunhal. Neste ponto, em se tratando dos mesmos fatos investigados, não se verifica empecilho para a aplicação do instituto".

Para o magistrado, a situação respeita a necessidade de aplicação do contraditório. "Não há dúvida da legitimidade do requerimento de compartilhamento da prova emprestada. Independentemente de haver identidade de partes, o contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo", finalizou.

Processo nº: 1025599-89.2019.4.01.0000


AASP 19/01/2021. TJSC - Nenhum direito é absoluto, decide juíza ao autorizar acesso a dados de celular apreendido

 

Sob o entendimento de que nenhum direito é absoluto e de que o interesse público se sobrepõe ao interesse particular, a Justiça da Capital autorizou o manuseio e perícia de um aparelho celular apreendido pela polícia em uma ocorrência de tráfico de drogas. A decisão é da juíza Érica Lourenço de Lima Ferreira, da 3ª Vara Criminal da Capital, definida na audiência em que homologou a prisão em flagrante de uma suspeita detida com porções de entorpecentes como crack e cocaína.

Conforme observou a magistrada, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem precedente no sentido de que, se o telefone celular foi apreendido em busca e apreensão determinada por decisão judicial, não há óbice para que a autoridade policial acesse o conteúdo armazenado no aparelho, inclusive as conversas de Whatsapp. Assim, para que seja feita a análise e utilização desses dados, não é necessária nova autorização judicial.

"O direito à intimidade e à vida privada não pode servir de salvaguarda a condutas criminosas. Até porque nenhum direito é absoluto. O interesse público, aqui compreendido no direito a uma persecução penal efetiva, se sobrepõe ao interesse particular, o que sugere nesse caso o afastamento episódico de tais direitos fundamentais, sobretudo por haver indícios de envolvimento dos investigados nos crimes de tráfico de drogas", escreveu a juíza.

Como o Ministério Público apresentou acordo de não persecução penal, tendo em vista que a conduzida não apresenta antecedentes penais e o delito não envolveu violência ou grave ameaça à pessoa, tendo pena mínima inferior a quatro anos, a magistrada homologou o acordo. A acusada concordou com as condições estabelecidas, entre elas a confissão do crime e a comunicação mensal de suas atividades ao juízo. (Autos n. 5002660-32.2021.8.24.0023).



Por que é necessário tornar o feminicídio um crime autônomo?

 25 de janeiro de 2021, 6h36

Por Natalie Alves e Yuri Sena

Segundo a Lei nº 13.104/2015, feminicídio é a circunstância qualificadora do crime de homicídio consistente em matar uma mulher por razões da condição de sexo feminino — isto é, quando o crime envolve violência doméstica e familiar ou o menosprezo ou a discriminação à condição de mulher. A despeito dos incontestáveis avanços trazidos pela citada norma, a vinculação desse crime ao tipo de homicídio tem se mostrado insuficiente em face da premência que o tema demanda.

Na condição de tecnologia social, o Direito deve atender à função de pacificar as relações sociais e promover a justiça. Quando se observa a criminalização do assassinato de mulheres em razão de seu gênero, temos que a atual legislação é insuficiente para coibir a prática de feminicídio no país.

Baseado nisso, foi apresentado o Projeto de Lei nº 4.196/2020, pelos deputados Fábio Trad (PSD/MS), Santini (PTB/RS) e Pedro Lucas Fernandes (PTB/MA), que pretende tornar o crime de feminicídio tipo penal autônomo.

Em síntese, a inciativa é meritória porque representa importante avanço tanto no âmbito global de enfrentamento à discriminação de gênero quanto no aperfeiçoamento dos instrumentos jurídicos aptos a coibir a prática desse delito. A necessidade da medida ressai, sobretudo, porque: 1) o feminicídio, por sua própria essência e natureza, se diferencia substancialmente do homicídio, devendo a lei refletir essa distinção; 2) estatisticamente, a tipificação do feminicídio enquanto circunstância qualificadora do homicídio prejudica a sua quantificação; e 3) operacionalmente, a legislação atual impede resposta sancionatória a que fazem jus os "feminicídios qualificados".

A tipificação do feminicídio não é fenômeno isolado do Brasil: apenas na América Latina, outros 15 países [1] possuem em suas legislações dispositivos específicos que punem o assassinato de mulheres por razões da condição do gênero feminino.

Em sua origem, o termo foi concebido para definir o assassinato de mulheres precedido por um continuum de terror antifeminino, que inclui uma ampla variedade de abusos verbais e físicos [2]. Isso significa que o feminicídio não é um ato singular, mas representa o trágico desfecho de uma história de violência, agressões e discriminação. Ao contrário das demais hipóteses de homicídio, que, de tão amplas, podem ocorrer com diversas circunstâncias e motivações, o feminicídio possui peculiaridades que se reproduzem.

De acordo com pesquisa realizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo [3] sobre os feminicídios cometidos no Estado, o autor do crime, em 70% dos casos, era convivente ou ex-convivente da vítima; em 79% dos registros, o instrumento do crime eram objetos ou meio de fácil acesso nas residências (arma branca, instrumentos domésticos ou o uso das próprias mãos); o local do crime, para duas em cada três, era a própria casa da vítima; e as motivações mais comuns eram separação do casal, pedido de rompimento, ciúmes, sentimento de posse ou machismo.

Esses fatos revelam que, na prática, o feminicídio não se limita a um homicídio "mais grave". O crime representa, na verdade, um atentado à própria condição da mulher, afetando, de forma geral, todas as mulheres da sociedade — o que atrai o interesse público específico na sua capitulação como crime autônomo. Enquanto o país figura na amarga posição de quinto país [4] com maior proporção de feminicídios, não se pode acreditar que sua ocorrência é meramente o prematuro fim da vida de determinada mulher, mas, sim, que se está diante de quadro sintomático de uma estrutura social que vitima mulheres em várias dimensões.

O cenário clama, portanto, que o Direito reconheça essas especificidades na forma de um tipo penal autônomo, imprimindo um efeito simbólico que repercutirá, inclusive, na maior reprovabilidade social do crime.

Além disso, deve-se atentar à necessidade de quantificar os feminicídios praticados, tendo em vista que a elaboração de estatísticas robustas é o primeiro passo para a criação de políticas públicas efetivas de enfrentamento ao crime. Todavia, a classificação do feminicídio como circunstância qualificadora do homicídio dificulta a sua efetiva contabilização em âmbito nacional.

Isso porque não há uma estatística unificada acerca da razão dos óbitos no país. Os dados utilizados pelo Fórum Nacional de Segurança Pública, por exemplo, são gerados pelo Sistema de Informações de Mortalidades do Ministério da Saúde (SIM/Datasus), que não incorpora tipificação legal ou motivação da agressão para registrar os óbitos. As únicas informações estatísticas disponíveis sobre o feminicídio se baseiam nos registros de ocorrência disponibilizados pelas Secretarias de Segurança Pública estaduais.

Ocorre, contudo, que, da forma como atualmente está previsto o crime de feminicídio, é possível que a autoridade policial enquadre uma possível ocorrência de feminicídio como homicídio, ou que os protocolos de registro em determinado Estado também considerem esse crime (e a sua investigação) como suspeita de homicídio.

O processo pedagógico de incorporação da perspectiva de gênero por parte das delegacias de polícia, a propósito, é uma das razões pelas quais os pesquisadores do Anuário Brasileiro de Segurança Pública constatam o progressivo aumento na quantidade de feminicídios registrados desde 2015 também por causa "do processo de aprendizagem por parte das polícias em relação à adequada identificação e ao registro do feminicídio" [5].

Tornando feminicídio tipo penal autônomo, será mais evidente — e simbólica — a mensagem do legislador aos órgãos que atuam diariamente na apuração de infrações penais de que o feminicídio guarda peculiaridades em relação ao homicídio e assim merece ser abordado.

Por fim, convém adentrar em questão mais técnica e operacional de nosso sistema jurídico. Circunstância qualificadora significa dado acidental ao crime, que serve apenas para estabelecer novos limites mínimo e máximo para a pena do autor. Em outros termos, segundo a dogmática jurídica, as razões de gênero no feminicídio são apenas um elemento acessório para a punição do agente que o comete [6].

O uso desse instituto jurídico, todavia, impede, operacionalmente, que outras circunstâncias qualificadoras sejam utilizadas para elevar os limites das penas de feminicídio, porque o Direito brasileiro, do ponto de vista técnico, não emprega a figura dos "crimes duplamente qualificados". Sendo assim, ainda que o feminicídio não se confunda com motivo torpe ou o emprego de asfixia, o fato de esses elementos serem qualificadoras do crime de homicídio permite que sejam igualmente considerados para a dosimetria da pena.

Isso leva à conclusão de que, na dosimetria da pena dos feminicidas, o emprego de outras qualificadoras é sopesado pelo juiz na forma de mais uma agravante ou circunstância judicial negativa, não sendo previstos novos limites mínimo e máximo para fixação da pena. Por meio da previsão do crime de feminicídio enquanto tipo penal autônomo, será possível a conjugação mais harmônica da aplicação da pena para aqueles que cometem esse tão grave crime em conjunto com circunstâncias qualificadoras do homicídio.

Com efeito, não se pode negar a importância da Lei nº 11.304/2015 para o enfrentamento da violência de gênero em nosso país. Entretanto, para o aprofundamento desse combate, é necessário que se avance sobre o tema, tendo a aprovação do PL 4.196/2020 o potencial para cumprir o papel da atividade legiferante de estar sempre atenta à realidade social e às demandas que ela imprime.

 


[1] COMPROMISSO E ATITUDO. Legislações da América Latina que penalizam o feminicídio. Disponível em: http://www.compromissoeatitude.org.br/legislacoes-da-america-latina-que-penalizam-o-feminicidio/.

[2] RADFORD, Jill; RUSSELL, Diana E. H. Femicide: The Politics of Woman Killing. Nova Iorque: Twayne, 1992, p. 15. Tradução livre.

[3] FERNANDES, Valéria Diez Scarance; et al. Raio X do feminicídio em São Paulo: É possível evitar a morte. Ministério Público do Estado de São Paulo. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Nucleo_de_Genero/Feminicidio/RaioXFeminicidioC.PDF. Acesso em 29 de outubro de 2020.

[4] Taxa de feminicídios no Brasil é quinta maior do mundo; diretrizes nacionais buscam solução. Organização das Nações Unidas. 01 de março de 2017. Disponível em: http://themis.org.br/onu-taxa-de-feminicidios-no-brasil-e-quinta-maiordo-mundo-diretrizes-nacionais-buscam-solucao/.

[5] FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA – FBSP. Anuário brasileiro de segurança pública. Edição XIV. São Paulo, 2020, p. 119.

[6] BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral 1. 24. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 824.

STJ revoga prisão após reconhecimento por fotografia feito por WhatsApp

 25 de janeiro de 2021, 12h44

Por Danilo Vital

Ainda que a jurisprudência brasileira admita o reconhecimento por meio fotográfico, mesmo quando não forem observadas todas as formalidades do artigo 226 do Código de Processo Penal, é preciso que o ato seja corroborado por outros elementos de prova para justificar a imposição de prisão cautelar.

Vítimas argentinas receberam foto dos suspeitos de crime no litoral catarinense

Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a recurso em Habeas Corpus para revogar a prisão preventiva de um réu por roubo cujo reconhecimento foi feito por fotografias, enviadas pelo aplicativo WhatsApp às vítimas.

A decisão foi unânime, em caso julgado em 15 de dezembro de 2020. O acórdão foi publicado no dia 18 do mesmo mês.

O reconhecimento foi feito dessa maneira porque o crime foi cometido no litoral catarinense contra turistas argentinos, que voltaram para casa no dia seguinte ao roubo.

Eles registraram boletim de ocorrência em que descreveram como três criminosos invadiram o local alugado, com os rostos cobertos por bonés e lenços tapando boca e nariz, armados com revólveres e uma faca. À polícia, mensuraram idade e altura dos envolvidos, e citaram características físicas.

As investigações levaram à apreensão de dois dos envolvidos. O terceiro foi reconhecido porque, na busca e apreensão, encontrou-se um cartão bancário com o nome do suspeito, cujas características batiam com a descrição das vítimas: altura elevada, os olhos verdes, moreno e braços peludos. À polícia, uma das pessoas que residia no local disse já ter se relacionado com o suspeito.

Para o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a prisão estava bem justificada porque não houve o envio de fotos aleatórias, já que existiu uma prévia investigação que identificou alguns suspeitos. Já a 6ª Turma entendeu que não ficou demonstrado que o reconhecimento foi corroborado por outros elementos de prova.

Relator, o ministro Sebastião Reis Júnior destacou que o crime foi cometido por pessoas com rosto parcialmente coberto e que, ainda que o suspeito reconhecido por foto tenha histórico criminal, consta apenas a apreensão de um cartão bancário em seu nome.

A apreensão ocorreu no local onde foi realizada diligência que resultou na prisão de um dos corréus, sendo que há suposto vínculo de afetividade acusado com algumas pessoas que lá residiam, já tendo uma delas, inclusive, relacionado-se com o réu.

“Portanto, no caso, o reconhecimento fotográfico com inobservância das regras procedimentais do artigo 226 do Código de Processo Penal, realizado exclusivamente pelo envio de fotografias ao telefone celular das vítimas por meio de aplicativo de mensagens — WhatsApp —, não corroborado posteriormente por mais elementos capazes de demonstrar o envolvimento do recorrente aos fatos, não é suficiente para validar a custódia cautelar que lhe foi imposta”, concluiu.

Precedente do STJ

O tema do reconhecimento por fotografia é controverso na jurisprudência brasileira e foi, recentemente, abordado em precedente da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Em outubro, o colegiado decidiu que a exibição de fotos deve ser etapa antecedente a eventual reconhecimento pessoal.

O acórdão relatado pelo ministro Rogério Schietti fixa diretrizes a serem seguidas e reforça o disposto no artigo 226 do Código de Processo Penal. Há duas premissas objetivas: que a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento descreva a pessoa que deva ser reconhecida; e que o suspeito seja colocado, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la.

RHC 133.408

Medidas cautelares não podem ser computadas para detração, diz TJ-SP

 25 de janeiro de 2021, 17h40

Por Tábata Viapiana

A legislação brasileira não prevê a detração para as medidas cautelares diversas da prisão. Com esse entendimento, a 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo negou um pedido de detração pelo período em que a ré estava em liberdade provisória, cumulada com medidas cautelares.

Medidas cautelares não podem ser computadas para detração, diz TJ-SP

Ao TJ-SP, ela pediu a detração do tempo que cumpriu recolhimento domiciliar noturno porque a medida comprometeria o "status libertatis" e, portanto, deveria contar como pena efetivamente cumprida. No entanto, segundo o relator, desembargador Edison Brandão, não é possível equiparar a prisão preventiva às medidas cautelares.

O magistrado afirmou que o artigo 42 do Código Penal deixa claro que o que se computa à pena corporal ou medida de segurança é o tempo de prisão provisória, que não se confunde com qualquer das cautelares previstas no artigo 319 do CPP, "que, aliás, como o próprio nome diz, são alternativas à prisão, e visam justamente evitar a imposição desta".

"Daí porque, conforme corretamente decidido pelo magistrado singular, inexiste previsão legal para o que se pretende, uma vez que as medidas cautelares não comprometem a plena liberdade do réu, além de que, embora tivesse o dever de cumprir certas condições para permanecer usufruindo o benefício da liberdade provisória, não cumpria efetivamente pena", completou Brandão. A decisão foi por unanimidade.

Processo 0005957-06.2020.8.26.0026

Agressão contra mulher transexual deve tramitar em Vara de Violência Domésti

25 de janeiro de 2021,

A Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, diante de conflito de competência suscitado no caso de uma mulher transexual agredida pelo companheiro, decidiu que o processo deve tramitar na Vara do Foro Central de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de São Paulo.

Segundo decisão do TJ-SP, na apuração das supostas lesões sofridas deve incidir a Lei Maria da Penha 
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Consta dos autos que a vítima, biologicamente do sexo masculino, mas que se identifica como mulher e ostenta nome social feminino, teria sido agredida por seu namorado após uma crise de ciúmes. Foram constatados elementos que indicam motivação de gênero no crime, que ocorreu em âmbito doméstico, já que vítima e agressor moravam juntos.

De acordo com o relator, desembargador Sulaiman Miguel, a jurisprudência do TJ-SP vem decidindo pela aplicação das medidas protetivas da Lei Maria da Penha a indivíduo biologicamente do sexo masculino, mas com nome social feminino, em caso de agressões de ex-companheiro. Por isso, o caso deve tramitar em vara especializada em violência doméstica, e não em vara criminal comum. 

"Prestigiando o princípio da dignidade da pessoa humana, deve ser reconhecida sua identificação com o gênero feminino e a consequente vulnerabilidade no relacionamento amoroso, compatível com a ratio legis invocada, vivenciando a dominação do gênero masculino sobre o feminino, fazendo incidir, na apuração das supostas lesões sofridas, a Lei Maria da Penha", disse. A decisão foi unânime. 

Com informações da assessoria de imprensa do TJ-SP.