6 de outubro de 2020, 19h28
A decisão judicial ou
administrativa que impede a imprensa de acessar dados públicos com base no
possível uso que se fará dos mesmos configura inequívoca censura. E a
existência de portal que eventualmente forneça essas informações não afasta o
direito líquido e certo de obtê-las a pedido.
TJ-SP entendeu que acesso
a dados policiais colocaria em risco vítimas de crimes
Com esse entendimento, a
2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso do Grupo
Folha, que fora impedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo de acessar lista
dos registros de entrada de corpos nas unidades do IML no município de São Paulo,
por meio de dados constantes de delegacias de polícia.
A decisão foi unânime,
conforme o voto do relator, ministro Og Fernandes. "É um caso Kafkiano.
Você vê que o dono da informação quer dar a informação, mas o tribunal entende
que não deve", comentou o ministro Mauro Campbell.
A corte paulista proibiu
a divulgação dos dados sob alegação de risco à segurança e à privacidade dos
familiares das vítimas, pela exposição em reportagens. E ainda apontou ausência
de interesse de agir, já que as informações seriam posteriormente publicadas em
portal de acesso público.
O ministro Og Fernandes
destacou que não é função da administração pública ou do Judiciário apreciar as
razões ou usos que se pretende dar às informações de natureza pública. "A
informação, por ser pública, deve estar disponível ao público,
independentemente de justificações ou considerações quanto aos interesses que
se distinga o uso", disse.
O relator destacou que a
postura do TJ-SP configura bis in idem censório: impediu o
acesso à informação pública e a liberdade de imprensa, direitos que são
autônomos e não se confundem.
Ressaltou que a hipótese
sequer é de produto jornalístico acabado, que poderia gerar "de forma
absolutamente excepcional e, ainda assim, questionável", um controle
de sua circulação, diante dos potenciais danos que poderia causar.
Haveria, assim, diversas formas de aproveitar tais dados como subsídio à
atividade jornalística.
"Configura
inequívoca censura prévia impedir-se a imprensa que até mesmo apure eventual
interesse jornalístico de divulgação de dados, reitere-se, inequivocamente
públicos", disse o ministro Og.
Segundo ele, segurança
individual não é hipótese de exceção de acesso a dados públicos. Eventuais
danos, caso efetivados, se resolvem pela responsabilização civil,
administrativa ou penal.
"A existência de
portal com dados públicos solicitados apenas configura meio de cumprimento da
obrigação de fornecer acesso ao solicitante, mas não enseja a rejeição de
pedido de informações nem afasta seu direito líquido e certo de tê-las",
concluiu. A previsão consta do parágrafo 3º do artigo 11 da Lei de Acesso à
Informação.
REsp 1.852.629
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