'Direito de ser esquecido' é mais
veneno que remédio
Por Ronaldo Lemos*
Em tempos de privacidade cada vez mais rara,
cresce o debate sobre o "direito ao esquecimento". Na semana passada
ele se materializou em uma decisão da Corte Europeia de Justiça. Por ela,
qualquer site pode ser obrigado a remover da internet dados "inadequados
ou que não sejam mais relevantes".
Um cidadão espanhol reclamava que, ao buscar seu
nome na rede, aparecia o link de um artigo de jornal publicado há 16 anos
falando sobre o leilão de uma propriedade sua para quitar dívidas. A corte
entendeu que o link deveria ser tirado do ar.
Apesar da preocupação legítima, o "direito
de ser esquecido" é dos temas mais espinhosos hoje. Não por acaso
entidades anticensura protestaram contra a decisão. A razão é o risco de
efeitos colaterais. Como é praticamente impossível definir os limites desse
direito, as decisões tornam-se subjetivas. E aí os problemas são muitos.
Por exemplo, pode haver chuva de gente
solicitando a revisão do que está na internet, e também em arquivos de jornais,
revistas e redes de TV. É como se ficasse liberado o revisionismo histórico.
Se há qualquer dado que desagrada alguém, basta
pedir para apagá-lo. Outro problema é que a informação considerada
"irrelevante" hoje pode não ser mais amanhã.
Um exemplo é a queima de processos judiciais
"velhos". Assim foi destruído o processo de indenização por acidente
de trabalho do ex-presidente Lula. Independentemente do apreço que se tenha por
ele, trata-se de documento de interesse histórico.
Por isso, o "direito ao esquecimento",
sob o prisma da liberdade de expressão, é mais veneno do que remédio.
Publicado na Folha de São Paulo
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