terça-feira, 26 de novembro de 2013

STJ dá novo entendimento jurídico para o crime de Descaminho.

Em 12 de Outubro deste corrente ano, no julgamento do habeas Corpus nº 218961, a Ministra Laurita Vaz do STJ, relatora do writ, acompanhada por seus pares, definiram que o crime de descaminho possui natureza formal, sendo desnecessário, portanto, a avaliação do imposto iludido para a sua concretização.

Previsto no Código Penal em seu artigo 334, segunda parte, este crime tem como conduta principal o verbo “iludir” – leia-se obstar o recolhimento do tributo devido pela entrada e saída de mercadorias.

Assim sendo, a simples entrada de mercadorias estrangeiras no país sem o recolhimento dos impostos alfandegários caracterizaria o crime de descaminho e, segundo entendimento do STF, para a formatação da ação criminosa seria desnecessária qualquer prática ardilosa ou fraudulenta do agente bastando, somente, a não declaração da mercadoria excedente á cota (Resp. nº 238.373-PE).

Ainda em sede de habeas Corpus (HC nº 99.740) o STF, por voto do Ministro Aires Brito, entendeu que por ser o crime de descaminho de natureza formal, a sua consumação e a posterior abertura de processo criminal não depende da constituição administrativa do débito fiscal. Diante disso, incabível seria aguardar o julgamento dos recursos em via administrativa para a apuração penal.

Todavia, com a prática do crime de descaminho ficam comprometidos somente os recolhimentos tributários, II e IE (imposto de importação e exportação), IPI (imposto sobre produtos industrializados) e ICMS (impostos sobre circulação de mercadorias) revelando na verdade uma sonegação fiscal.

Nesse sentido, contrariando o entendimento dos tribunais superiores e acompanhando alguns doutrinadores e juristas, vejo o descaminho com um crime tributário vez que atinge, exclusivamente, os interesses da Fazenda quando pretende ver o seu tributo recolhido. Por essa razão, mereceria o mesmo tratamento dos crimes dispostos na Lei nº 8.137/90 que define os Crimes Contra a Ordem Tributária.

Doutrinadores como Paulo José da Costa Jr. e Cesar Roberto Bitencourt defendem ser o descaminho um crime de sonegação fiscal, com natureza tributária, que ataca diretamente os cofres públicos: “... enquanto o descaminho, fraude ao pagamento dos tributos aduaneiros, é, á grosso modo, crime de sonegação fiscal, ilícito de natureza tributária, pois atenta imediatamente contra o erário público”.

O TRF da 2ª Região, neste mesmo sentido, em decisão da relatora dos Embargos Infringentes nº 98.02.27550-6, Desembargadora Tânia Heine, proclamou que o descaminho é uma fraude meramente aduaneira e que protege tão somente o interesse do Fisco. Assim, “... o entendimento que abraçamos, mais condizente com a realizada e a estrutura da ordem jurídica, bem como com os fins que o próprio Estado se propõe para a sua política criminal, afora os dados da ordem econômica, é de que aqui há a salvaguarda tão-somente do interesse fiscal...”.

Também, não há como negar a sua identidade com os crimes contra a ordem tributária previstos na lei 8.137/90 em especial nas condutas definidas no artigo 1º inciso I, suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, e, por conseguinte, não se poderá negar o mesmo tratamento dado, inclusive com a extinção da punibilidade através do pagamento do tributo.

Diante da semelhança das condutas e do entendimento do STF que suprime do crime de descaminho qualquer prática ardilosa, ou fraudulenta por parte do agente bastando somente a não declaração da mercadoria excedente á cota ou sua declaração a menor, temos as mesmas condutas e resultado para ambos os tipos, portanto inexiste diferença.

O STF, ao editar a Súmula Vinculante 24 “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo estabelece que o artigo 1º inciso I da Lei nº 8.137/90 é crime material, portanto o crime de descaminho pela sua identidade de conduta e resultado com o crime fiscal deve ser considerado também material, portanto, merecedor dos privilégios dados aquele, isto é, enquanto não houver findo o processo administrativo fiscal, não caberá apuração de crime.

No sentido de o descaminho ser crime de natureza fiscal, ressalto, também, que o STF consolidou o entendimento de que deve ser reconhecida a aplicação do princípio da insignificância sempre que o imposto devido não ultrapassar o montante legal em que se dispensa o ajuizamento da execução fiscal, qual seja, R$ 10.000,00, valor definido na lei nº 10.522/2002. Menciona o texto legal que dar-se-á o arquivamento das execuções fiscais cujo valor consolidado for igual ou inferior ao supra referenciado.

Em se tratando de descaminho, estando o valor do débito fiscal no patamar que dispensa a execução fiscal, não faz sentido dar azo à persecução penal sob pena de utilizarmos o Direito Penal como “prima racio”. Portanto, entendendo que quando desnecessária a persecução fiscal, não há razão para a ação penal.

Por fim, vejo o crime de descaminho como um crime fiscal. Por isso não vislumbro razão para não ser a ele aplicado o mesmo tratamento dado aos crimes tributários tais como os preceitos da Súmula Vinculante 24, a extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo a qualquer tempo, a suspensão da pretensão punitiva do Estado caso haja o parcelamento do débito – REFIS - e, por fim, a aplicação do princípio da insignificância quando o valor do tributo não ultrapassar R$ 10.000,00.

Carlos Gianfardoni - Advogado

Gianfardoni & Fuschi Advogados e Consultores Jurídicos

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