Na batalha contra a máfia, a Itália criou os juízes sem rosto -
magistrados que não tinham a identidade revelada nem na hora da sentença. No
Brasil, contra as organizações criminosas que matam desafetos, negociam drogas
ou avançam sobre o erário, os juízes agora vão poder atuar em colegiado quando
tiverem que tomar decisões severas contra investigados. É o que prevê a Lei 12.694, publicada ontem no Diário
Oficial da União, sancionada pela presidente Dilma Rousseff para assegurar
à toga maior segurança.
Em processos ou procedimentos sobre delitos praticados por organizações
criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de um conselho para a prática
de qualquer ato, especialmente decretação de prisão ou de medidas
assecuratórias - interceptação telefônica, ordem de buscas e ação controlada.
"(A lei) Pode evitar episódios como o do
juiz Paulo Augusto Moreira Lima, do caso Cachoeira", diz o desembargador Henrique Nelson
Calandra, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). "É muita pressão sobre um único magistrado.
O trabalho em conjunto, compartilhando as deliberações, pode neutralizar
intimidações."
Em junho, após ameaças, Moreira Lima deixou o comando do processo que
envolve o contraventor Carlinhos Cachoeira. Alegou que não tinha mais condições
de permanecer à frente da investigação. "Ele
(Moreira Lima) estava exaurido", diz Calandra. "Intimidações são comuns nesse tipo de procedimento. Processo que
derruba um senador da República (Demóstenes Torres). Quer mais o quê?"
Deliberações. O colegiado poderá deliberar sobre concessão de liberdade
provisória ou revogação de prisão, sentença, progressão ou regressão de regime
de cumprimento de pena, concessão de liberdade condicional, transferência de
preso para estabelecimento prisional de segurança máxima e inclusão do preso no
regime disciplinar diferenciado.
O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as
circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão
fundamentada, da qual será dado conhecimento à Corregedoria do tribunal ao qual
está vinculado. O colegiado será formado pelo juiz do processo e por dois
outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico, dentre aqueles de competência
criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.
A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.
As reuniões poderão ser sigilosas "sempre
que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão
judicial". As decisões do colegiado, "devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os
seus integrantes", serão publicadas sem nenhuma referência a voto
divergente.
Identidade. "É passo
importante para fortalecer o Judiciário na parte mais próxima da população, a
primeira instância, por isso sujeita às ameaças e vinganças daqueles que são
contra o Estado de Direito", disse o desembargador Roque Mesquita de
Oliveira, presidente da Associação Paulista dos Magistrados.
O presidente da Associação dos Juízes Federais em São Paulo, Ricardo
Rezende, alerta que "em muitos casos
o juiz realmente é um alvo fácil, uma figura totalmente desprotegida".
O advogado Pierpaolo Bottini diz que "é
justificável o reforço a medidas de segurança aos juízes, diante de recentes
atentados". E adverte: "A
formação de um colegiado para atos como a sentença afeta a garantia da
identidade física do juiz, porque ao menos dois magistrados integrantes do
grupo não estiveram presentes no momento de produção da prova, não participaram
dos interrogatórios, das audiências de testemunhas". A criminalista
Beatriz Catta Preta considera a criação do colegiado "medida desnecessária, porque é inerente ao cargo do juiz tomar
decisões independentemente da periculosidade ou não do investigado".
Fonte: O Estado de S.
Paulo – Nacional
Fausto Macedo
http://www.aasp.org.br/aasp/imprensa/clipping/cli_noticia.asp?idnot=12565
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