O processo do mensalão terá repercussões importantes que ultrapassam a
esfera política. No julgamento, marcado para começar em 2 de agosto, o Supremo
Tribunal Federal (STF) definirá o que pode ou não ser qualificado como lavagem
de dinheiro, com implicações diretas na atividade de bancos e empresas do país.
Os ministros vão dizer em quais condições os diretores e presidentes de
instituições financeiras podem ser considerados culpados por lavagem. Eles
também vão esclarecer até que ponto uma pessoa tem que estar ciente da origem
ilícita do dinheiro para ser condenada. Outra decisão envolverá quais condutas
devem ser reconhecidas como criminosas antes que seja identificada a lavagem.
"O STF vai decidir quem é o responsável pelo crime de lavagem, e essa definição terá impacto direto para os bancos, bem como para corretoras de valores", diz o criminalista Pierpaolo Bottini, que defende o ex-deputado Professor Luizinho, do PT, um dos denunciados no caso. Como a acusação envolve uma série de condutas diferentes, será preciso esclarecer quais delas estão inseridas no conceito de lavagem e quem pode ser declarado culpado: quem fez os saques na boca do caixa, os políticos que pediram a verba aos bancos, os dirigentes das instituições financeiras que não teriam fiscalizado o procedimento?
"O STF vai decidir quem é o responsável pelo crime de lavagem, e essa definição terá impacto direto para os bancos, bem como para corretoras de valores", diz o criminalista Pierpaolo Bottini, que defende o ex-deputado Professor Luizinho, do PT, um dos denunciados no caso. Como a acusação envolve uma série de condutas diferentes, será preciso esclarecer quais delas estão inseridas no conceito de lavagem e quem pode ser declarado culpado: quem fez os saques na boca do caixa, os políticos que pediram a verba aos bancos, os dirigentes das instituições financeiras que não teriam fiscalizado o procedimento?
Um dos motivos que levam o julgamento do mensalão a ter resultado
imprevisível é que o STF não costuma analisar processos criminais desde o
começo, inclusive aqueles envolvendo lavagem de dinheiro.
"O Supremo nunca enfrentou o assunto tão
frontalmente. São pouquíssimos acórdãos sobre lavagem de dinheiro", diz o advogado Luciano Feldens, que defende
o publicitário Duda Mendonça. "É
difícil chegar esse tipo de delito no STF porque, a rigor, é uma Corte
Constitucional", aponta João Gomes, advogado do ex-deputado Paulo
Rocha, do PT, outro acusado.
Em geral, questões criminais são levadas ao Supremo em habeas corpus,
mas a maioria deles é analisada pelas turmas, onde votam cinco ministros, e não
no plenário, onde votam os onze integrantes do Supremo Tribunal Federal. "O habeas corpus é um remédio para
sanar alguma ilegalidade e, nesses julgamentos, não se costuma fazer um
mergulho profundo na prova", diz João Gomes.
No mensalão, isso será diferente. O foro privilegiado de alguns dos
acusados levou o caso diretamente ao Supremo, sem passar pela 1ª instância.
Assim, além de verificar as provas contra cada um dos 38 réus, os ministros
terão que analisar a fundo questões teóricas de direito penal que são novas na
Corte.
Em relação ao crime de lavagem, os ministros vão discutir se o
beneficiário de um saque tinha que saber previamente da origem do dinheiro para
ser considerado culpado, e quais as evidências necessárias para provar isso. É
o caso de réus que sacaram dinheiro de contas dos bancos Rural e BMG,
justificando que era verba para campanha, como os deputados Paulo Rocha e
Professor Luizinho. O Ministério Público chegou à conclusão de que essas verbas
vinham do "valerioduto".
Agora, caberá ao STF dizer se esses réus e os diretores do banco devem ser
condenados.
"O Rural tem convicção de que o banco e
seus executivos à época cumpriram as regras e a legislação vigentes", informou o Rural em nota. O banco enfatizou
que informou ao BC e ao Coaf sobre "todas
as transações ocorridas no período e passíveis de comunicação" e que
mesmo não tendo a obrigação de identificar as pessoas que fizeram os saques,
manteve as informações em seu sistema e apresentou-as às autoridades.
Uma das discussões mais importantes é a do chamado dolo eventual na
lavagem de dinheiro. A lei não admite a lavagem com culpa - quando uma pessoa
não tem certeza de que está infringindo a lei. Na lavagem, é preciso que haja
dolo, ou seja, crime cometido com conhecimento prévio. A dúvida diz respeito ao
meio termo, o chamado dolo eventual, nos casos em que a pessoa sabia que havia
algo suspeito e mesmo assim agiu em desacordo com a lei. É o caso da mãe de um
traficante que recebe dinheiro do filho e compra uma casa. Ela não tinha
certeza absoluta de que o dinheiro era ilícito, mas podia supor isso. Ela deve
ser condenada?
O STF terá de responder questões semelhantes no mensalão. "Qual é o nível de consciência
necessário em relação ao crime anterior?", exemplifica Feldens. No
caso de Duda Mendonça, a Corte também terá que definir se alguém que recebe
dinheiro no exterior por serviço prestado regularmente (no caso, a campanha do
PT em 2002) lavou dinheiro ou não. O entendimento poderá afetar não apenas
empresas, mas também advogados que recebem dinheiro de clientes sem verificar a
procedência.
Outra definição relevante diz respeito ao crime antecedente. Como a
lavagem é a ocultação ou dissimulação de valores provenientes de outros crimes,
é preciso identificar quais são eles. A Lei de Lavagem (nº 9.613) traz uma
lista controversa de oito antecedentes - entre eles, tráfico de drogas,
terrorismo, crimes contra a administração pública, o Sistema Financeiro
Nacional e praticados por organização financeira. Essa regra será alterada em
breve com a edição de uma nova Lei de Lavagem, que foi aprovada pelo Congresso.
Mas, no caso do mensalão, o STF terá que se posicionar sobre os
antecedentes segundo a lei atual. Uma das principais polêmicas envolve o "crime praticado por organização
criminosa". Na denúncia do mensalão, ao mencionar a lavagem, a
Procuradoria-Geral da República teve que identificar os crimes antecedentes.
Para diversos réus, foi descrita a participação em uma "organização criminosa".
Acontece que, ao analisar recentemente um habeas corpus dos fundadores
da Igreja Renascer em Cristo, a 1ª Turma do STF entendeu que não existe na
legislação brasileira a figura da "organização criminosa". Com isso,
a ação penal perdeu sentido e foi encerrada. No caso, os líderes da igreja
Estevan Hernandes Filho e Sonia Hernandes eram acusados de praticar lavagem
através da entidade religiosa que arrecadava dinheiro dos fiéis. Cinco
ministros da 1ª Turma participaram do julgamento e absolveram os réus.
Agora, o plenário do STF terá que se posicionar sobre o mesmo assunto no
mensalão. "A acusação por lavagem no
processo está amparada em um tripé de crimes antecedentes: o peculato, a gestão
fraudulenta de instituição financeira e o crime praticado por organização criminosa",
diz Feldens. A defesa tentará anular parte da acusação com o mesmo argumento do
caso Renascer.
Além de lavagem, o mensalão definirá precedentes sobre os crimes de
corrupção e gestão fraudulenta de bancos. No caso de corrupção, é preciso
demonstrar claramente que quem recebeu dinheiro deu algo em contrapartida? E
para condenar bancos deve-se mostrar que eles provocaram abalos no sistema
financeiro? São algumas questões que o STF vai responder no mensalão,
orientando bancos e empresas.
Fonte: Valor Econômico –
Financeiro
Juliano Basile
e Maíra Magro - De Brasília
http://www.aasp.org.br/aasp/imprensa/clipping/cli_noticia.asp?idnot=12391
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