segunda-feira, 4 de junho de 2012

STF valida vara de crime organizado


O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou válida a Lei nº 6.806, do estado de Alagoas, que criou uma vara especializada no julgamento de processos contra integrantes do crime organizado. O entendimento, fixado por 9 votos a 1, abre precedente para que outros estados criem varas colegiadas destinadas exclusivamente a processar e julgar delitos praticados por organizações criminosas. Para o ministro Luiz Fux, relator do processo, a decisão terá um impacto de fundamental importância no combate à criminalidade no país. 

A determinação foi tomada ontem durante a análise de uma ação proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra a lei alagoana que, em 2007, instituiu a 17ª Vara Criminal de Alagoas, composta por cinco juízes. A entidade pedia que a norma fosse considerada inconstitucional, sob o argumento de que não há previsão legal de órgãos colegiados na Justiça de 1º grau, com exceção dos Tribunais do Júri, que julgam os crimes contra a vida, e da Justiça Militar. A OAB alegava, ainda, que a lei afrontava o artigo 22 da Constituição Federal, que reserva à União a prerrogativa de legislar sobre o direito penal.

Os argumentos, porém, não convenceram os ministros, com exceção de Marco Aurélio, para quem o órgão foi criado à margem da lei. Os demais presentes entenderam que há um vácuo constitucional acerca da criação de varas colegiadas de primeira instância. Por isso, definiram que o estado de Alagoas agiu dentro da legalidade e "complementarmente à Constituição" ao instituir a vara.

Para os ministros que formaram a maioria no julgamento, a composição colegiada protege os magistrados de ameaças feitas por organizações criminosas. Atualmente, uma vara criminal comum conta com um juiz titular e um substituto. Na criação de uma especializada, os casos dessas quadrilhas seriam analisados por um grupo de diferentes juízes. A avaliação geral dos ministros é de que a figura do juiz sem rosto, acarreta em imparcialidade nos julgamentos e aumenta a segurança para magistratura, que, no ano passado, perdeu a juíza Patrícia Acioli, assassinada em Niterói (RJ). Patrícia, executada com 21 tiros na porta de casa em 12 de agosto, era conhecida pela rígida atuação contra a ação de grupos de extermínio na região de São Gonçalo.

"Isso tem a virtude de unir a colaboração de todos os juízes, não permitir a identificação pessoal de quem produziu aquela decisão e, ao mesmo tempo, dá uma resposta a altura à criminalidade organizada", destacou Fux. "O mais importante é a inovação na criação de uma Justiça de primeiro grau colegiada, em que os magistrados cooperam entre si na elucidação da criminalidade organizada. Alagoas deu o primeiro passo, mas se servir de exemplo para outros estados teremos uma Justiça criminal muito eficiente no combate ao crime organizado", acrescentou. 

Fux alertou que a decisão do Supremo atende a uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que já se manifestou pela criação de órgãos colegiados especializados no combate a organizações criminosas. "É o primeiro estado que adota essa providência à luz da Convenção de Palermo contra o crime organizado. Essa é uma recomendação do II Pacto Federativo firmado em 2009 e o CNJ também já havia recomendado que houvesse essa preocupação na criação de juízos de primeiro grau colegiados." 

Embora tenham mantido o funcionamento da 17ª Vara Criminal de Alagoas, os ministros consideraram ilegal a forma de indicação dos juízes integrantes do colegiado, que era de livre iniciativa do presidente do Tribunal de Justiça. Para a maioria, o critério compromete a imparcialidade. Assim, o STF fixou prazo de 90 dias para a designação, com regras mais rígidas. 

Especialização 

Para o sociólogo Ignácio Cano, do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), a decisão é um avanço. "O combate ao crime organizado é uma prioridade para o Brasil. A decisão é uma ótima notícia", afirmou. Cano avalia que esse modelo levará mais celeridade aos julgamentos e proteção aos magistrados em relação a possíveis retaliações relativas às sentenças. "Os colegiados tiram o foco da responsabilidade de apenas um juiz, e assim, o protegem individualmente." 

Já o advogado e ex-secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça Pierpaolo Bottini considera que um dos principais méritos da proposta é oferecer ao tema complexo um olhar mais especializado. "Ao se especializarem, os juízes acumulam conhecimento, o que facilita o julgamento", destacou. Por outro lado, o especialista teme que o colegiado possa distanciar os magistrados de cada caso a ser julgado. "Existe uma regra clara em processo penal: a de que o juiz que entrou em contato com as provas e que ouviu as testemunhas é quem deve julgar. No caso do colegiado, isso fica mais complexo. É preciso estabelecer a obrigação de todos estarem presentes", completou. 

Fonte: Correio Braziliense – Brasil
Diego Abreu
Larissa Leite

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